O Governo Sob o Desgoverno

Por João Valente | 27/01/2009 | Sociedade

"Todo boato tem um fundo de verdade".

"Nada há mais decisivo e vantajoso numa batalha do que conhecer antecipadamente os planos de ataque do inimigo", dizem os que estudam a arte da guerra.

O próprio Führer teria sido derrotado, afinal, não por estrita supremacia dos aliados, mas porque estes contaram, desde antes da guerra, com a revelação prévia e precisa dos planos e códigos secretos nazistas por nove "auxiliares" diretos de Hitler, os quais faziam vazar as datas e os locais dos ataques alemães, segundo o livro "A guerra foi ganha na Suíça", de Pierre Accoce e Pierre Quet.

De todo modo, isto são apenas ínfimas indicações de que as contendas são ganhas por quem detém, com antecedência, a informação das intenções militares do inimigo, muito mais do que por possuir armas devastadoras (estas, aliás, hoje em dia, se não forem bem usadas, aniquilarão o próprio País que as detone), embora, como é óbvio, associar as duas coisas seja muito melhor.

Mas o que poderia ser ainda mais vantajoso do que a simples presciência dos planos do inimigo? A título de exercitar a mente, imaginemos agora que maiores vantagens, em conjunto, poderiam ser estas:

(1a) Conhecer os planos do inimigo, muito antes de sua execução (e mesmo de sua formulação);

(2a) Possuir armas não apenas devastadoras, mas virtualmente inimagináveis pelo inimigo;

(3a) Possuir armas que possam aniquilar apenas o inimigo, deixando intactos bens e riquezas deste;

(4a) Conhecer não apenas os planos, mas toda a vida íntima do inimigo, o que ele pensa, o que gosta de fazer, o que não gosta, como fala, como dorme, como está sua saúde, etc.;

(5a) Deixar o inimigo cada vez mais convencido de que não possui inimigos.

Num segundo exercício de raciocínio, verifiquemos agora, nas entrelinhas do cotidiano, se a realidade inteira não poderia ser uma grande cortina de fumaça para esconder a existência de um Governo "sob o desgoverno". Ora, não podemos deixar de admitir que se houvesse um adversário que dispusesse das armas acima elencadas, dificilmente ou nenhum de nós nem ao menos chegaria a suspeitar de tal fato, sendo, literalmente, presa fácil e uma vítima virtualmente indefesa, mesmo que possuísse arsenais nucleares (pois vimos que as vantagens não estão nos megatons, mas na "pré-espionagem"). Com efeito, que defesa poderíamos ter contra um inimigo que nasceu antes de nós e que conhece tudo o que iremos pensar ou desejar no futuro? Entretanto, se tal dado se confirmar, por que esse inimigo ainda não nos destruiu?

Na certa todo o caos de nosso tempo, todos os sofrimentos e todas as misérias nada mais são que a forma macabra de operar o modus faciendi de uma dominação subliminar, como se tudo isso fosse a sinistra orquestração de uma ópera cujo resultado não está ao alcance de olhos mortais.

Então haveria de fato um governo "sob o desgoverno", ao qual interessa manter exatamente o quadro que aí está. E se lhe é interessante e apetitoso manter o quadro caótico, não podemos deixar de pensar que tal governo deve auferir vantagens não apenas de quem vive, mas também de quem morre.

É como se o mundo fosse um grande panelão de uma cozinha industrial, sobre cuja tampa estaríamos vivendo, ora a sentir calor, ora angústia, ora tédio, ora nada. Mas o fim de tudo não seria a tampa, e sim o interior da panela, e só ele seria mexido. Mas a mexida interior de nada valeria, pois lá não há liberdade.

Nem tudo o que é absurdo é impossível, e tudo o que é plausível é possível. E nenhum de nós sairia a desmascarar esse Governo, pois, embora ele não tenha sido eleito por nenhuma mente consciente, ninguém iria admitir que o caos tem um comando (do qual emanam as ordens que nenhum poder temporal desobedecerá), e se admitisse, certamente venderia até a alma para não denunciá-lo.

João Valente de Miranda.

(DN, 11/06/99).