“Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura, jamas” (Che)

A morte de Fidel Castro não foi surpresa, pois com 90 anos de idade e saúde debilitada, já estava aguardando na fila para a última viagem. Entretanto, mesmo assim, ainda era uma figura emblemática, um líder político lendário, pois emergiu a partir de uma guerrilha que derrubou o ditador cubano Fulgêncio Batista, que comandava com mão de ferro um governo corrupto, controlado pela máfia da jogatina americana.  O regime de Batista foi bem retratado pelo escritor americano Graham Green em “Nosso Homem em Havana” e em “Os comediantes”.  A vitória de Fidel se deu no contexto da Guerra Fria e ele tinha duas opções, sendo que a primeira seria se tornar um ditador seguindo o modelo do seu antecessor, que significava continuar um regime que manteria a ilha como um quintal norte-americano e da jogatina ou a segunda, dar uma guinada de 180 graus e se aliar à URSS, implantando um regime socialista. Fidel preferiu a segunda opção com todos os seus riscos, ou seja, desafiar a maior potência capitalista do mundo a apenas 160 quilômetros de distância.

Se de um lado a revolução cubana reduziu as desigualdades sociais, melhorando a educação e saúde, implantou também um regime de exceção, perseguindo e prendendo os seus inimigos, seguindo a cartilha stalinista. Foi aí que a famosa frase de Ernesto Che Guevara foi desmascarada, pois implantou apenas o endurecimento sem ternura alguma. O próprio Che, com a sua falsa aura de herói romântico, executou vários adversários a sangue frio, como conta o escritor francês Regis Debray, que foi um aliado do regime nos primeiros tempos.

Mas Fidel manteve-se firme no poder, apesar das várias tentativas de eliminá-lo através da CIA e de outros inimigos. Os pobres de Cuba o idolatraram, pois desapropriou todas as terras, mas os antigos proprietários o juraram de morte. Apoiado militarmente e financeiramente pela poderosa URSS, a ditadura cubana sobreviveu mais de cinquenta anos como a única revolução marxista nas Américas.

Mas o fim da URSS colocou em cheque o regime. Sem os recursos soviéticos Cuba deveria sobreviver a sua própria sorte e ainda por cima com o bloqueio econômico dos EUA. Fidel, já debilitado, passa o poder para o seu irmão Raul, talvez como uma forma de manter ainda alguma influência sobre os destinos do país. A partir daí começam as tímidas reformas, mesmo a contragosto de Fidel que continuava acreditando na sua revolução que ele mesmo criticava em um momento de lucidez: “Nosso regime não deu certo nem aqui...” Com a ascensão do bolivariano Hugo Chaves, Cuba voltou a receber ajuda econômica, mas essa fonte também acabou. Secaram também os financiamentos do BNDES, pois com a nossa recessão e mudança de governo, a ilha da Fantasia não poderá mais contar.

Com a morte de Fidel, talvez Raul Castro consiga ir adiante com seu programa de reforma abrindo a economia da ilha, incluindo mudanças políticas e institucionais que acabem com a repressão política, a censura e o estado de exceção. Obama bem que tentou, ao iniciar a distensão com o regime cubano, mas não conseguiu concluí-la, pois o congresso americano, controlado pelos republicanos, é contra qualquer mudança no status quo. Com a eleição do Trump, é provável que fique mais difícil a continuidade da abertura iniciada por Obama.

Assim, o povo cubano continuará ansiando pela liberdade, pois somente a igualdade não resolve todas as questões humanas.  Acesso livre à internet, liberdade de ir e vir, imprensa livre, coisas corriqueiras para nós, continua ainda sendo um grande sonho dos cubanos, pois além da liberdade, faltam recursos que são bastante escassos na ilha.