1 INTRODUÇÃO

A partir das formas mais rudimentares, até as mais complexas de organização social, o Direito garante a convivência dos homens organizados em grupos sociais, objetivando um convívio pacífico e harmonioso, pois muitas vezes, para compartilhar os mesmos ares e recursos naturais, as liberdades têm que ser limitadas pela lei, para garantir a sobrevivência da organização social.

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O direito Penal surge num contexto Social a fim de regular esta convivência em sociedade, através de normas e regras que se fazem cumprir pela ameaça das sanções correspondentes, também, conhecido por Direito Criminal é um ramo do Direito com procedimento conveniente para manter a sociedade regrada, através da noção de justiça e princípios valorativos e normativos, ou seja, materialmente e formalmente competente para punir aqueles considerados culpados dos fatos atentatórios á ordem social.

O Estado emprega este conjunto de normas preventivamente, para evitar as infrações tipificadas, também, para impor as sanções punitivas correspondentes aos autores culpados pelos fatos antijurídicos. Os valores fundamentais como o direito a vida, a liberdade, a propriedade, e outros, são bens jurídicos tutelados pelo Estado, portanto, amparados pelo Direito Penal, com intuito de manter a harmonia social, propagam o temor aos prováveis delinquentes, ameaçando-os com imposições de penas e medidas de segurança, assegurando o não cometimento de crimes.

Ao se falar em direito a liberdade, pode parecer que a norma penal é atentatória a um princípio básico da dignidade humana, ela além de formalmente descrever um fato como infração penal, ao impor a sanção, aparentemente estará contradizendo a Constituição, mas vale lembrar, que ao condenar o autor de fato tipificado como crime à pena privativa de liberdade, o Direito Penal não dará importância ao sentimento do apenado, pois, ao selecionar o comportamento humano, certamente a norma vislumbrou que o fato afrontou e lesionou os valores da sociedade, portanto, não há de se dizer em inconstitucionalidade da punição, tendo em vista, o Estado ser legítimo e estar em consonância com os princípios derivados do perfil de Estado Democrático de Direito.

Cumpre observar preliminarmente, que o Estado Democrático de Direito reúne princípios constitucionais que regem as ações humanas, regula democraticamente o sistema Penal, de modo geral e na esfera criminal, pois, surgem inúmeros princípios penais, derivados da dignidade da pessoa humana, onde, todo fato tipificado que contrariar a dignidade humana, estará contrariando o Direito Penal, ou ainda, atentando ao fundamento existencial do Estado Democrático de Direito.

A natureza jurídica material dos princípios, hierarquicamente superior às normas formais, é caracterizada pela generalidade, abstração e baixa densidade normativa, ou seja, os princípios regulam uma imensa gama de situações concretas de forma generalizada, com poder de limitar a subjetividade e o arbítrio estatal.

Convém ressaltar, que as propriedades transcendentais, tipificadas formalmente como crime, algumas vezes, pode materialmente não ser consideradas delituosas, por não ferir valores sociais, em virtude dessas considerações, os princípios gerais do Direito, estando expressos ou intrínsecos na previsão legal, possuem aplicabilidade e vigência, pois, são normas jurídicas substanciais que estabelecem modelos de conduta, critérios diretivos com juízo de valor social, que norteiam o Direito Penal, dando garantias que o Estado não abusará do direito de punir.

2 O DIREITO PENAL 

A existência humana sempre exibe seus aspectos obscuros, que se traduzem no mundo do direito por meio das palavras, crime e pena, entretanto, nesse domínio sombrio e não inteligível brilha a luz do Direito Penal e seus princípios, que ilumina, com seus raios de compreensão, a vida de todos. (PAGLIUCA, 2009, p 35). 

A Sociedade suprimiu há tempos à vingança privada, nos dias atuais entrega a responsabilidade de se fazer justiça ao Estado, este por sua vez, monopoliza a fonte de normas, determina seu cumprimento e aplica coercitivamente as sanções, quando essas são descumpridas. Douto que não subsiste norma de Direito Penal desamparada de sanção, sendo que, esta, tem a finalidade de proteger e garantir o respeito a bens jurídicos e valores sociais relevantes acaba subdividindo-se em vários níveis, correspondentes com a gravidade do delito, portanto, a sanção será cominada de acordo com o valor transcendental do bem jurídico desrespeitado, para que não represente apenas, à reposição do estado anterior a lesão sofrida pela vítima, com relação à conduta ilícita. (MIRABETE, 1994, P 46).

Não somente tem a função de defesa social, o Direito penal exerce a função de garantir aos cidadãos, que o Estado não abuse do direito de punir. No ordenamento jurídico pátrio, o Direito penal possui a função de classificar as ações humanas e seu comportamento antissocial, principalmente, daqueles que colocam em risco os valores fundamentais, descrevendo como infrações e prevendo sanções penais, ou seja, a “missão do direito penal é proteger os valores fundamentais para a subsistência do corpo social, tais como a vida, a saúde, a liberdade, a propriedade etc., denominados bens jurídicos”. (CAPEZ, 2011, p 19).

Frederico José Marquez vislumbra o direito Penal em duas vertentes, sendo uma, no direito de punir, outra, no direito limitador para punir, ou seja, o direito penal como tutela da liberdade individual, e outra, do direito que tipifica o crime como fato e a pena como sua consequência, disciplinando as relações jurídicas, derivadas deste fato, estabelecendo a aplicação da medida de segurança e a tutela do direito de liberdade pelo poder do Estado em punir. Pena e crime são inseparáveis, estão codificadas num conjunto de normas compelidas em um diploma legal básico, que não é exclusivo, pois existem as chamadas leis penais especiais ou extravagantes, assim conhecidas justamente por não estarem no código penal e serem aplicadas por órgãos de justiça penal especializado. (1964 p.15).

Temos como exemplo de lei penal especial, o código penal Militar, o Direito penal Eleitoral e as leis extravagantes como exemplam a lei 11.343/06 lei de tóxicos, lei 8.072/90 que dispõe sobre crimes hediondos e a 11340/2006 lei Maria da Penha e muitas outras.

A doutrina faz distinção entre direito penal objetivo e direito penal subjetivo, sendo o primeiro, justamente o direito positivado no texto legal, consistente no conjunto de normas que regulam a ação estatal, definindo os crimes e cominando as sanções respectivas, enquanto, o segundo é o direito de punir o agente violador da norma jurídica. Outra distinção que a doutrina faz, é o direito penal Substantivo e o direito penal Adjetivo. O primeiro é o direito material, é o mesmo conjunto de normas que compõem o direito penal objetivo. O segundo se confunde, com o direito processual penal, na medida em que seria o instrumento formal (processo e Procedimento) pelo qual se aplica o direito penal Objetivo, contudo, o direito penal Adjetivo tem a função de natureza Ético-social, consiste na proteção ou tutela dos bens jurídicos considerados fundamentais pela sociedade, através da ameaça de uma sanção e “impondo sanções aos sujeitos que praticam delitos, o Direito Penal robustece na consciência social o valor dos bens jurídicos, dando força ás normas que os protegem”. (DAMASIO, 2003, p 14).

O Direito Penal surge quando as infrações aos direitos e interesses individuais ultrapassam as proporções, ou então, quando outros ramos do direito não foram suficientes para o controle social, então cumprindo seu objetivo, o direito penal age como meio de restabelecer o domínio social, encontrando soluções aos conflitos humanos. A finalidade preventiva é uma das suas principais características, pois, antes de punir o agente delituoso, suas normas proibitivas e cominadas com as sanções respectivas, objetivam evitar a prática nela tipificada, razão esta, que o texto legal é estudado pela ciência normativa, e este conjunto de conhecimento sistematizado, observa seus preceitos norteadores pelo “dever ser” e as consequências de seu não acatamento. (BITENCOURT, 2009 p 11).

A escolha dos bens jurídicos a serem tutelados e a modalidade de proteção, em termos quantitativos e qualitativos, é uma função constitucionalmente do legislador, embora ele tenha total liberdade, a constituição impõe limites; o legislador não poderá cominar penas “de morte, perpétuas de liberdade ou de trabalhos forçados”, bem como, na escolha dos bens jurídicos ou valores a serem protegidos, ou na seleção de qual comportamento será tido como ofensivo, o poder estatal deverá ser zeloso, tendo em vista, serem inúmeros os direitos fundamentais atribuídos a toda pessoa humana, consagrados na constituição, que serão limitados pelo Estado, diante da necessidade ditada pelo interesse social.

É que as garantias individuais e os direitos coletivos, não são absolutos, o maior e fundamental dos direitos do ser humano, que é a vida, não é absoluto, no art. 5º inc.XLVII da CRFB há exceção expressa de que, “salvo em caso de guerra” haverá a pena de morte, isto significa que o valor transcendental (vida humana) é relativo em razão de um valor maior, que é a sobrevivência da nacionalidade, ameaçada por guerra declarada contra potência estrangeira. (BRASIL, 2009).

O direito fundamentado na constituição, quase absoluto, por ser irrenunciável, é a Dignidade da pessoa humana, mas, ele torna-se relativo, quando conflita com outros princípios não dele derivados e quando envolvem interesses particulares, portanto, há de se ponderar para não privilegiar a dignidade de uma pessoa em face da outra. (BARROSO, 2009, p 356).

Neste sentido, denomina o Direito Penal, como normas jurídicas estabelecidas pelo Estado, com a finalidade de combater os crimes, os fatos, condutas e omissões sociais que demonstram contrários as normas de direito, forjando os ilícitos jurídicos que atentam contra os bens mais importantes da vida social.

2.1 DIREITO PENAL E SEUS PRINCÍPIOS 

A Constituição de 1988 estabeleceu para o Brasil, o perfil de Estado Democrático de Direito, deste modelo, partem princípios regradores dos mais diversos campos da atuação humana. No que diz respeito ao âmbito penal, há um gigantesco princípio constitucional, norteador de todo o sistema penal, que o torna democrático. Trata-se do cabal princípio da dignidade da pessoa humana, que serve de guarida a inúmeros princípios penais, sendo assim, o legislador penal, formaliza as condutas atentatórias através das leis e materializa os princípios, conforme a evolução social. (CAPEZ, 2011, p 25).

A norma penal, em um Estado Democrático de Direito, não é somente aquela que descreve um fato como infração penal, ela deve amasiar o tipo incriminador, deverá obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos, somente aqueles que realmente possuam lesividade social. O delito ocorre em todas as sociedades constituídas pelo ser humano, é um fenômeno social normal e cumpre a função de manter aberto o canal de transformações de que a sociedade precisa.

2.1.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE  

O Código Penal em seus primeiros passos manifesta o mais importante de seus princípios, ao determinar que não haja crime e nem pena, sem lei anterior que os defina. A garantia facultada neste artigo 1º do CP, nenhum comportamento pode ser considerado crime sem que uma lei anterior à sua prática o defina como tal; de mesmo valor, nenhuma pena poderá ser aplicada sem prévia cominação. Trata-se de axioma imprescindível para haver segurança jurídica e garantia da liberdade social, tolhendo a possibilidade de que alguém seja punido por uma conduta não tipificada na época de sua prática, bem como, evitando que a pena aplicada seja arbitrária, impondo a ela prévios limites. (DELMANTO, 2010, p 76)

Embora o princípio da Legalidade seja fundamental no Direito Penal, seu reconhecimento constitui um longo processo, com avanços e recuos, não passando muitas vezes, de “fachada formal”, pois tal princípio é imperativo e não admiti exceções, sendo assim, “nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena pode ser aplicada, sem que antes da ocorrência desse fato, exista uma lei que o defina como crime e culmine uma sanção correspondente”, portanto, a lei deve defini-lo com precisão. (BITENCOURT, 2009, P 14).

Alguns doutrinadores não confundem o princípio da Legalidade em face ao princípio da reserva legal. Nas lições de Fernando Capez, o principio da legalidade é um gênero monopolizador que abarca inconfundivelmente a reserva legal. (2011, p 57.)

A constituição de 1988 em seu artigo 5º, inc. XXXIX determina que “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, neste sentido, não se admite sanções criminais de expressões vagas, equívocas ou ambíguas, impedindo o Estado de interpretá-las de forma errônea. Ao interpretar esse artigo, através do princípio da legalidade, fica esclarecido que o Estado não poderá usar a analogia ou costumes para instituir crime ou sanção. 

2.1.2 PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL

O princípio da Reserva Legal é denso em sua formalidade, não é genérico e estabelece de forma concreta a regulamentação textualizada da matéria penal incriminadora; seus termos legais, só tem eficácia após a publicação oficial legítima. (CAPEZ, 2011, p 57.)

Alguns doutrinadores não estabelecem diferenças entre o Princípio da Reserva Legal em face do Princípio da Legalidade, no entanto, os clássicos do Direito Penal diversificam este, atribuindo ao principio da legalidade, uma consistência monopolizadora tendo em vista sua abstrata abrangência.

2.1.3 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA 

A intervenção mínima começa a ser observada exteriormente a partir da fragmentariedade do Direito Penal. Ajusta-se na Declaração de Direitos do Homem e do cidadão, de 1789, cujo artigo 8º determinou que a lei só devesse prever as penas estritamente necessárias. (CAPEZ, 2011, p 36).

De acordo com este princípio, é conveniente ao Direito Penal influir no meio social apenas em última instância, sendo o direito de “ultima rátio”, ou seja, ser empregado somente e após esgotarem todas as demais esferas da ordem jurídica capazes de resolver o impasse, por este motivo, assume a característica de ser subsidiário. (PAGLIUCA 2009, p 42)

A ação ou o efeito de intervir do Direito Penal, é legalmente exigida por uma necessidade de aumento de proteção à sociedade, a infração deve consubstanciar em um grave iníquo ou ameaçador e dar importância a uma culpabilidade mais elevada, deve ser uma infração que mereça sanção penal. “Não se devem incriminar os fatos em que a conduta não implique risco concreto ou lesão a nenhum dos bens jurídicos reconhecidos pela ordem normativa constitucional”. (MIRABETE, 1994, p 114).

O princípio da intervenção mínima norteia e restringe o poder incriminador do Estado, recomendando que a criminalização de uma conduta só deva ser efetivada, se essencialmente for o meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico, portanto, havendo outras formas de sanção ou outros meios de controle social e estas forem suficientes para a tutela desse bem, sua criminalização é inadequada e não recomendável, ou seja, “se forem suficientes as medidas civis ou administrativas para restabelecer a ordem jurídica, aplicar-se-á estas e não as penais”, pois, quando os demais ramos do direito revelarem-se incapazes de tutelar os bens sociais relevantes, é que se aplica o Direito Penal. (BITENCOURT, 2009, P 17).

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