Miriam

Era em um sítio a alguns quilômetros da cidade de Sousa, que moravam Miriam e seu marido Leonardo. Eles eram muito pobres, mas viviam felizes criando os seus dez filhos. E há pouco tempo, Miriam descobriu que esperava mais um filho. Apesar das pouquíssimas condições, um filho para eles era sempre bem-vindo.

Leonardo era agricultor, tinha um pequeno terreno, no qual todos os anos, plantava milho e feijão, e era com a colheita desses legumes que sustentava seus rebentos e sua mulher. Tratava-se de um homem trabalhador, só não tinha oportunidades, por isso, não tinha sucesso financeiramente.

Naquele tempo, as oportunidades eram raras, o governo não oferecia programas sociais, isso dificultava a vida dos que eram pobres. Viver em pobreza extrema era comum na zona rural.

Quando o ano era bom de chuva, ou seja, quando havia um ótimo inverno, a colheita de Leonardo era feliz, entretanto, quando o ano era de seca, eles enfrentavam a fome e sofriam muito.

Toda essa situação ruim não abalava a alegria de viver de Miriam e Leonardo. Os filhos incentivam aquele casal a gostarem de viver, a trabalhar e enfrentar as situações precárias, assim como as mazelas, existentes na vida. Eles já haviam superado muitas doenças dos filhos, como o sarampo, a catapora e a papeira. E tudo isso, sem nenhuma assistência médica. Eram uns guerreiros.

Miriam era uma mulher de trinta anos, baixa, muito magra e pálida, consequências de sua má alimentação. Tinha os olhos e os cabelos pretos e a pele queimada pelo sol. Casou muito jovem, aos dezoito anos e nunca conheceu outro cenário, senão aquele que vivia. Miriam nunca nem foi à cidade, seus filhos nasciam em casa, sem assistência médica. Mas nunca reclamava da sorte, pois amava Leonardo e isso lhe bastava.

Leonardo também era bastante conformado com a vida. Trabalhava a semana inteira e aos sábados gostava de ir a uma bodega, que ficava distante de casa, para se distrair e espairecer a vida, como ele mesmo dizia. Nesta bodega, Leonardo conversava com alguns conhecidos e falava sobre a seca, ou o inverno e sobre a colheita dos legumes.

Um dia, em um fatídico sábado pela manhã, ele foi a esse estabelecimento, como de costume.

_Vorto na hora do aimoço. Disse ele a mulher.

_Tá certu. Disse Miriam.

Aquele era o ano de 1966.

Ao chegar a tal bodega, o marido de Miriam encontrou  um velho conhecido seu,que  estava bebendo. No passado, eles tiveram uma desavença  em decorrência de um porco de Leonardo, que foi parar no terreno deste homem e o mesmo não quis devolvê-lo, isso causou uma rixa entre eles.  Neste dia, Leonardo resolveu beber também e acabou  tocando no assunto do porco, o que gerou uma discussão entre eles. Leonardo, muito alterado, chamou o homem de ladrão. Este, por sua vez, puxou uma faca da cintura e esfaqueou o marido de Miriam.

Leonardo não resistiu e morreu naquele local. O assassino fugiu e o dono da bodega, assim como os outros homens que estavam ali, não foi atrás do criminoso, talvez por medo ou por pura covardia.

Minutos depois, o dono do estabelecimento foi avisar a Miriam, sobre o ocorrido. Foi um momento muito triste e doloroso. Quando a mulher viu o bodegueiro chegando a sua casa, logo desconfiou que algo de ruim tinha acontecido, com seu marido.  A pobre esposa ficou bastante pálida e começou a tremer. As crianças ficaram assustadas ao redor da mãe. O homem foi bem objetivo e disse:

_Leonardo ta morto.

Miriam caiu no solo chorando e gritando desesperadamente. Quanto as crianças, algumas tinham dimensão do ocorrido, daquela cruel realidade, já outras, as mais novas, ainda não sabiam o significado da palavra morte.

Aquela família outrora feliz, pesar das dificuldades agora choravam vítimas da violência, essa praga presente em todas as épocas. A violência é o pior dos males e destrói muitas famílias, ela aniquila sonhos e arruína a vida dos que só querem ser felizes.

Miriam não sabia o que fazer, grávida e com dez filhos para criar. Sua situação era muito difícil.

Dias depois, sem o marido, sem seu amor, ela teve que encontrar forças nos filhos para continuar vivendo. Estes, mesmo pequenos, tiveram que trabalhar na roça com a mãe, que até os nove meses de gravidez trabalhou na enxada. Praticamente nem teve resguardo, pois não podia deixar a roça nas mãos das crianças.

Mas o tempo passou e seus filhos cresceram e conseguiram lhe oferecer uma vida melhor. Foi muito difícil, mas um dia Miriam sorriu. 

Maria do Socorro Abrantes Sarmento