L ? IDOSOS: UM PATRIMÓNIO DE SABEDORIA E EXPERIÊNCIAS

Sumário

1. Introdução; 2. Percurso Normal da Pessoa Humana; 3.Contextualização do Idoso; 4. Políticas para a Dignificação e Intervenção do Idoso; 5. Resumo Conclusivo; Bibliografia

1. Introdução

Se há situações que incomodam muitos dirigentes políticos, governantes, institucionais e empresariais, em muitos países do mundo, uma delas é o crescente aumento do número de pessoas seniores com idades provectas, destacando-se de forma nítida grande parte dos países do velho continente, a Europa. Esta situação tem vindo a ser analisada com excessiva apreensão, especialmente pelos alegados encargos sociais que, exaustivamente, são invocados, quantas vezes por altos responsáveis quando, eles próprios, ainda não contribuíram o suficiente, para alimentar o sistema social público actual, do qual, todos, sem excepção, ricos e pobres, estão a beneficiar.
Os idosos, como vulgarmente são designadas as pessoas a partir de uma certa idade, (tradicionalmente a partir dos 65 anos), começaram a ser marginalizados precisamente, com a institucionalização de propalados argumentos de inutilidade e, ainda mais grave, invocando-se os custos sociais que eles causam ao erário público, ignorando-se que, foram eles, no seu tempo de vida activa, com as respectivas comparticipações que alimentaram o sistema, para os idosos de então auferirem os respectivos benefícios, bem como crianças e jovens usufruírem dos respectivos apoios através dos sistemas educativo, de saúde e outros direitos sociais para, finalmente, cúmulo da ingratidão, serem, justamente, estas gerações mais novas, de responsáveis institucionais, os grandes beneficiários dos descontos que os agora idosos, então fizeram no seu tempo, justamente, para proporcionarem as melhores condições de estudo e de vida e um futuro bem melhor para as gerações vindouras, hoje no poder em diversas instâncias nacionais e internacionais.
Os idosos, tal como as gerações que se lhes seguem, são o melhor património humano que um país pode ter, desde logo, se os responsáveis empresariais e de outras áreas, tiverem a inteligência e a visão estratégica de saber utilizar o imenso manancial de conhecimentos, experiências, sabedoria e prudência que a maior parte dos idosos possui, independentemente das suas culturas serem de natureza intelectualista ou antropológica. A pessoa humana, enquanto detentora de capacidades físicas, intelectuais e motoras em geral, pode (e deve) trabalhar para ela, para a família e para a sociedade, não havendo idade-limite para as funções, responsabilidades e actividades que ela sabe, pode e quer desenvolver. A riqueza de uma nação faz-se à custa da participação de todos e bem ao contrário da utilização apenas dos mais novos. Podem, inclusivamente, configurar actos de má gestão ou de gestão ruinosa, inaproveitamento dos recursos humanos mais experientes e capacitados, em qualquer fase da vida, para actividades específicas e compatíveis com a sua situação físico-intelectual.
Dispensando-se as estatísticas que periodicamente são divulgadas, por uma ou outra instituição, é do conhecimento directo de cada cidadão, de cada responsável, que a população europeia, de entre outras, tem vindo a envelhecer, sendo a esperança de vida favorável ao aumento da longevidade, o que implica um aumento no número de idosos, significando que os encargos sociais, de facto, evoluem exponencialmente com a agravante das comparticipações das gerações mais novas não aumentarem em idênticas, ou preferencialmente, proporções, devido às elevadas taxas percentuais de desemprego e a todo um conjunto de situações que conduzem ao empobrecimento da sociedade. Se há algumas décadas a proporção era de quatro activos para um reformado, hoje, possivelmente, aquela relação reduziu-se para metade ou menos, o que a continuar esta progressão, dentro de duas a quatro décadas, nenhum sistema social terá capacidade para cumprir os compromissos perante aqueles que contribuíram para o sistema, na expectativa de, quando idosos, usufruírem das condições de vida verdadeiramente dignas da pessoa humana.
É, pois, necessário, analisar com mais acuidade o enquadramento das pessoas ditas idosas, aos conhecimentos, experiências, competências e capacidades físicas e mentais, criando-se-lhes condições motivadoras para continuarem a trabalhar e, simultaneamente, manterem-se com elevada e reconhecida auto-estima, dignidade, valorização e estatuto social, como processo de realização permanente e satisfação de necessidades de reconhecimento, estima e respeito, ao nível da aceitação pública. Este património não tem sido suficientemente salvaguardado e rentabilizado.

2. Percurso Normal da Pessoa Humana

Do nascimento à morte, a vida do ser humano desenvolve-se em função de ciclos biológico-mentais, relativamente bem estudados, ao nível das diversas ciências que se ocupam das várias parcelas da realidade humana. Na verdade, enquanto crianças, ocorrem determinadas situações que implicam correcções compatíveis com uma determinada cultura e respectiva socialização, para que se adquiram os hábitos e pratiquem as acções adequadas, através dos procedimentos que se vão interiorizando, com forte incidência na construção da personalidade, no sentido de melhor adequação às regras, deveres e direitos em vigor na socieade. É fundamental para o futuro da criança que, desde bem cedo, ela possa adquirir uma personalidade estável, embora em permanente, dinâmica e por vezes dramática construção, para que o seu crescimento e enquadramento na sociedade se processe sem grandes conflitos, porque para Lima e Albuquerque, (2006, p. 246): "A personalidade está indubitavelmente relacionada com o desenrolar e o desfecho das nossas vidas. Com a escolha da nossa carreira, dos nossos relacionamentos e com a forma como nos sentimos em relação a nós próprios e aos outros (?). Assim, se por exemplo, na adolescência a identificação deixa de estar primariamente centrada nas introjecções parentais para se abrir a padrões culturais e ideológicos mais alargados, na meia-idade os investimentos generativos e a participação activa na cultura são cada vez maiores. Na última fase da nossa vida, os idosos mais integrados e sábios identificam-se com os padrões duradouros que definem a nossa humanidade."
Implementado todo o processo de socialização da pessoa humana, o período correspondente à primeira fase de preparação para a vida adulta, activa e produtiva, prolongar-se-á até ao fim do primeiro terço de vida, ou seja, por volta dos vinte e cinco a vinte e sete anos, considerando-se concluída a formação superior especializada num determinado domínio do conhecimento técnico-científico. O jovem terá adquirido, precisamente, à custa do contributo financeiro dos mais velhos, uma formação para poder participar na construção de uma sociedade mais justa, solidária e rica, mas também, na sua própria autonomia económico-social, profissional e progressão do seu bem-estar.
Seria correcto e da mais elementar justiça que o indivíduo, assim formado para a vida e para a sua própria independência, se colocasse ao serviço da comunidade em geral, daqueles que contribuiriam para a sua preparação técnica superior, por um determinado período de tempo, num regime de voluntariado, do tipo de serviços prestados à comunidade, em vez de, em muitas situações, iniciar de imediato a exploração daqueles a quem em parte deve a sua formação, ou então, com outros perspectivas, abandonar o país que lhe deu a formação e fixar-se no o estrangeiro, preparado para a vida, embora à custa do sacrifício dos contribuintes seus concidadãos. Até porque o que é investido na educação e formação, poderia muito bem ser canalizado, justamente, para assegurar uma velhice condigna àqueles que trabalhara e descontam durante décadas das suas vidas, tantas vezes com imensas dificuldades e privações de vária ordem; ora, se a política social fosse neste último sentido, os jovens de hoje não teriam acesso à educação e formação profissional no sistema público; logo, estes jovens recém-formados têm um dever moral, ético e de solidariedade para com os mais idosos.
Desenvolvida toda uma carreira profissional, seja qual for a actividade/profissão, durante um período obrigatório e relativamente longo, cerca de metade da vida, que de acordo com as novas perspectivas de longevidade, poderá corresponder a um período produtivo e de comparticipação fiscal-social de cerca de quarenta anos, segue-se uma nova fase, denominada de reforma/aposentação e ao consequente afastamento da actividade profissional que exerceu durante aquele longo período. A pessoa humana, assim desligada, abruptamente, de todo um conjunto de tarefas, rotinas, responsabilidades, poder, estatuto sócio-profissional e de intervenção na sociedade, corre sérios riscos de invalidez permanente e/ou morte prematuras que, naturalmente, provoca sofrimento e/ou luto, com eventuais consequências nocivas para todos aqueles que de alguma forma dependiam do recém-reformado. Nem valerá a pena invocar, até por uma questão de alegado preconceito economicista, os encargos que uma pessoa inválida acarreta para ela própria, para a família e para a sociedade, esta e nesta circunstância, representada pelo Estado através dos respectivos departamentos competentes. A questão é mais profunda e humana e assim deve ser analisada e solucionada. Ao recém-aposentado devem ser-lhe dadas novas e específicas oportunidades para se manter activo, produtivo e contribuinte. Ele continua a ser uma pessoa de direitos e deveres, com dignidade e não um simples número que integra uma qualquer estatística relacionada com a população idosa, inactiva e dispendiosa, como muitos responsáveis insinuam pelas práticas que assumem, pelas leis que elaboram, pela marginalização a que remetem centenas de milhares de idosos.

3.Contextualização do Idoso

O último terço da vida humana, que se poderá situar a partir dos sessenta e cinco anos de idade, será, porventura, o mais sensível, estimulante e enriquecedor, para o próprio e para os que com ele convivem, nas diversas situações: família, ocupação, convívio, defesa de valores, convicções e boas-práticas, em diversas modalidades. Na verdade, é legítimo, justo e de direito que aos sessenta e cinco anos, o cidadão que, durante décadas se sujeitou ao exercício de uma actividade profissional, cumprindo inúmeras regras, desde logo, horários rigorosos, submetendo-se às mais diversas e difíceis situações hierárquico-funcionais, possa desligar-se dessa actividade, por via de uma reforma compensadora, que lhe permita uma vida confortável, extensivamente àqueles que, de alguma forma, dele dependem, porque para isso já investiu, coercivamente, pelas contribuições que pagou, ao longo do período activo produtivo. O cidadão, que reunindo os requisitos legais para a aposentação, está no seu direito de a requerer e de lhe ser atribuída, mas, querendo, poderá continuar a trabalhar na mesma actividade, empresa/instituição em condições que, certamente, devem ser acordadas com a entidade patronal, incluindo um novo salário e outros benefícios sociais.
Uma outra alternativa, seguramente, se colocará ao cidadão idoso, terminado que seja o seu percurso profissional e passado à situação de reforma. Com efeito, o reformado, enquanto se considerar válido e pretender manter-se útil à sociedade, deve usufruir de outras e novas oportunidades de trabalho, justamente, em domínios que conhece, que gostaria de realizar e que pode, igualmente, ser produtivo. A opção por retomar uma actividade que teria sido interrompida, prosseguir na mesma profissão que exerceu durante o período normal de trabalho, ou iniciar uma nova ocupação, deve ser livremente tomada, sem constrangimentos, nem imposições legais inibidoras de o fazer e sem a necessidade que o obrigue a continuar a trabalhar. As oportunidades para o prosseguimento de uma vida activa, a todos os níveis, devem ser garantidas aos idosos logo no início desta fase das suas vidas, o que pressupõe alterações profundas nas mentalidades, ainda preconceituosas, sobre o juízo que fazem acerca da utilidade/inutilidade destes novos colaboradores.
Há toda uma educação que é necessário transmitir, não só aos próprios idosos, como a todos aqueles que integram a sociedade, dita activa, no sentido: da inclusão dos mais velhos na resolução dos problemas da humanidade; no enriquecimento dos cidadãos; no aproveitamento de todas as capacidades disponíveis desta nova classe etária, cada vez mais numerosa e marginalizada, principalmente aqueles que se integravam nos escalões sociais médio-baixos e baixos, porque os restantes, aqueles que durante a vida activa se posicionaram na denominada classe alta, por via dos rendimentos, estatuto social, habilitações, ocupação, intervenção política e outros processos de ascensão social, alguns, menos transparentes, estes, continuam a ocupar bons cargos, enquanto o desejarem e, quando já não querem, ainda os passam para os familiares e amigos. Em geral, segundo Saldida, (2004, p. 108): "O processo de envelhecimento confronta-se com os mitos e crenças pessoais e sociais de que nesta idade madura, as pessoas são incapazes de aprender, de desenvolver qualquer tipo de trabalho convincente e útil, de ter opções válidas sobre o que querem e igualmente incapazes de se adaptarem às novas formas de vida, a que chamam de actualidade."
O estigma paradigmático, que recai sobre esta numerosa população, deve ser desmontado rapidamente, sob pena de se perder a própria memória colectiva que une todo um povo, pelo menos na história, na língua, na cultura e nos valores. Desprezar o valioso contributo das pessoas que, não obstante terem entrado na recta final de suas vidas, continuam válidas, disponíveis para manterem uma boa colaboração: com a sociedade em geral; com as gerações mais novas, em particular, constitui um grave erro, para além de uma mesquinha ingratidão daqueles que, de alguma forma, detêm determinado poder de decisão. Defende-se aqui a teoria contrária, a que se adequa aos novos tempos, caracterizados por uma crescente desestruturação da família, com a brutal redução da taxa de natalidade e o aumento da esperança de vida, com um saber-ser e um saber-estar cada vez mais artificias, inseguros e inexperientes; apoia-se, pois, uma teoria e uma prática que privilegiem os idosos, que lhes dêem a oportunidade de passarem o testemunho de vida, e de saber, em condições dignas, ao longo deste período de vida que se considera o mais característico da vida e do ser humano, no qual coexistem capacidades, conhecimentos, experiências, sabedoria, prudência, valores e segurança nas convicções, onde toda uma existência se consolidou numa postura rigorosa, severa, mas também tranquila, confiante e estimulante para as gerações vindouras, porque, isto mesmo, ou seja, o elevado apreço pelos mais velhos ainda se verifica em determinadas situações, conforme descreve Mello, (2000, p.308): "Em algumas sociedades de pequena escala o significado da idade é exatamente o inverso, é sinónimo de experiência, de sabedoria. São os velhos que formam o conselho máximo da tribo, do clã. Os tempos mudaram, hoje se diz que a antiguidade não é posto. No entanto, no sistema de remuneração de algumas empresas, ainda predomina o tempo de serviço, como um critério de melhoria salarial e funcional."

4. Políticas para a Dignificação e Intervenção do Idoso

Os preconceitos, estigmas, paradigmas e outros juízos de valor sobre os idosos, têm vindo a contribuir para uma certa institucionalização de uma sociedade desumanizada, que despreza as gerações mais velhas, exceptuando-se, aqui, eventualmente, a única situação em que eles são considerados úteis: nos processos eleitorais, em que tudo se lhes promete e, no dia seguinte ao acto plebiscitário, tudo se lhe nega, incluindo o direito ao trabalho. Pactuar com estes comportamentos mesquinhos e hipócritas significa desenvolver uma sociedade de falsidades, de marginalização dos próprios concidadãos, grande parte dos quais, ainda com grande vigor físico, intelectual e dinamismo.
Novas políticas para a dignificação, recuperação e intervenção dos idosos na sociedade de todos, pode significar a diferença entre um futuro de valores, de convicções, de ideais realizáveis e um futuro sem perspectivas, atípico, sem sentido de vida. O progresso material e a felicidade espiritual da pessoa integrada numa sociedade verdadeiramente humanista passa, imperativamente, pela consideração devida aos mais velhos e a tudo o que eles representam, com sucessos e com fracassos, porque eles são a história, a língua, a cultura, as tradições, os valores, o trabalho feito que os mais novos estão a usufruir e, se possível a melhorar.
Uma primeira abordagem poderá ser desenvolvida no sentido de atender às necessidades daqueles que, por incapacidade de qualquer natureza, ou por opção própria, não podem e/ou não querem continuar na vida activa, preferindo os cuidados médico-sociais adequados acompanhados de uma vida de reflexão, de tranquilidade e de recordações. É certo que as famílias de hoje, por circunstâncias diversas, algumas já afloradas no ponto anterior, não têm condições materiais para cuidarem condigna e adequadamente dos seus idosos, nem possuem os meios técnicos e os recursos financeiros para lhe proporcionarem a melhor qualidade de vida, aliás, muito objectivamente refere Mello, (2000, 307-8): "Os parentes já não dispõem de tempo para deles cuidarem. A filha ou a nora têm uma ocupação fora do lar. A família cada vez mais limita o número de filhos. Como se percebe, os casais já não têm tempo para os filhos, quanto mais para os velhos".
Nestas circunstâncias têm de ser criados os melhores equipamentos de acolhimento e acompanhamento dignos do idoso, independentemente de sentimentos de amor, carinho e afecto que, sendo importantes, não são suficientes para uma boa qualidade de vida. Compete, então, à sociedade, através dos respectivos departamentos do Estado e Instituições Privadas, desenvolver as melhores condições para proporcionar a estes idosos um ambiente saudável, em todas as vertentes possíveis, designadamente, com o funcionamento competente de instituições apropriadas: centros de dia, lares, residenciais e outros equipamentos afins, funcionando com pessoal especializado nas diversas abordagens geriátricas, mas também com um sistema de visitas para os familiares ajustado às disponibilidades destes e à comodidade do idoso.
Por outro lado, afigura-se grave que por uma questão de preconceito, deixem os idosos em casa, sozinhos, durante mais de 14 horas, ou mesmo durante dias consecutivos, sem meios de apoio às necessidades mais prementes. Quantos idosos não aparecem mortos, com aspecto de algum abandono, em suas casas, sem que os parentes os tenham podido socorrer em tempo útil? (Ninguém deve ter qualquer preconceito a estas soluções, porque no outro extremo da vida, precisamente no início, quando a fragilidade é, ainda muito maior, também existem equipamentos adequados às respectivas idades: creches, jardins-de-infância para os bebés e crianças, cujos pais também não têm condições para estar com eles durante as vinte e quatro horas de cada dia).
Uma outra perspectiva solucionadora para os que preferem continuar uma vida activa, qualquer que seja a actividade, vínculo face a uma possível entidade patronal, condições de trabalho e remuneração, situa-se ao nível do exercício de funções que contribuam: não só para a manutenção da auto-estima ou até melhorá-la; como também no sentido do idoso realizar tarefas que lhe garantam uma maior autonomia económico-financeira, do que a que lhe é proporcionada pela reforma, repondo, assim, as perdas resultantes da aposentação, que sempre se verificam, na maioria dos casos; e ainda para o manter integrado na sociedade e sentir-se útil, como qualquer outro cidadão, cumpridor do direito de cidadania como é o trabalho, aliás, aos sessenta e cinco anos, grande parte das pessoas sofreriam danos irreparáveis, não só para elas, como para os familiares e, em geral, para a sociedade, se tivessem que ficar inactivas.
Compete ao Estado social e às empresas, criarem condições para manter ocupados, com dignidade e sem quaisquer preconceitos caritativos, os cidadãos que manifestem vontade de prosseguir uma actividade produtiva, razoavelmente compensadora em termos remuneratórios, cumulativamente com o valor da reforma que possam auferir, (como de resto já se verifica em certas elites da sociedade), naturalmente, sujeitando-se a todos os impostos devidos, como qualquer outro trabalhador, no período activo e normal de trabalho.
A recolocação dos cidadãos idosos reformados é um acto de boa gestão do Estado e das Empresas; constitui uma medida social do maior alcance que dignifica as partes envolvidas. Muito embora se tenha conhecimento da existência de programas sociais de apoio aos idosos, o que na prática se verifica, em Portugal, ao nível do sector privado, é que as pessoas, por exemplo, aos quarenta e cinco anos de idade, são velhas para obterem novo emprego e demasiado novas para passarem a uma situação de aposentação; no sector público do Estado, a situação não é melhor porque um funcionário da Administração Pública, Forças Armadas, de Segurança e outros Corpos Especiais, que passe à situação de reforma, fica legalmente impedido de continuar a trabalhar no sector público, com todos os direitos e deveres, podendo fazê-lo na condição coerciva de lhe serem retirados dois terços ao valor da reforma ou da remuneração das novas funções, conforme dispõe o Decreto-lei 179/2005 de 2 de Novembro, o que está em contradição com os programas sociais que, segundo Correia, (2003, p. 306) tem por objecto: "(?) Fomentar a autonomia do idoso incentivando a sua participação na vida da comunidade, (?) valorizar o idoso como detentor de experiências, saberes e culturas que a sociedade deve aproveitar e que deve preservar."
A terceira possibilidade, da utilização dos idosos, relaciona-se com os serviços de voluntariado, aqui balizado por condições estimulantes para o idoso, porque actualmente não será suficiente um voluntariado sustentado apenas em sentimentos de solidariedade, em virtudes de Caridade e Compaixão. Hoje, tal como acontece em muitas instituições de solidariedade social, exige-se um mínimo de competências que o voluntário deve possuir, sob pena de o seu trabalho não ser valorizado como merecido, ou tornar-se prejudicial, podendo-se invocar, a título de exemplo, o trabalho desenvolvido pelos Bombeiros Voluntários, Cruz Vermelha, Associações dos Amigos dos Hospitais, felizmente, entre muitos outros, sendo desejável e exigível que o voluntário seja competente, o que pressupõe conhecimentos, técnicas, experiências, formação permanente e actualização, logo, o mínimo que as Instituições, que têm ao seu serviço voluntários, devem fazer é compensá-los pelo seu trabalho, não necessariamente, sob a forma de um salário, um vencimento fixo e respectivas obrigações fiscais, mas, outro sim, uma gratificação que cubra, pelo menos, as despesas que o voluntário tem e lhe permita, inclusivamente, adquirir mais formação, meios para o exercício da actividade voluntária e algum outro benefício/regalia fiscal/social e/ou ao nível da própria instituição, por exemplo, no âmbito dos serviços que ela presta, nomeadamente descontos nos seus produtos, serviços e prioridade em relação aos utentes em geral.
O voluntariado continuará a ser sempre uma actividade excepcional, altruísta, merecedora de maior respeito e consideração, reconhecida e estimulada, materialmente recompensada, até porque ninguém é obrigado a ser voluntário em coisa alguma, portanto, mais uma razão para não lhe serem recusados os apoios necessários, de resto, as políticas de protecção social a nível europeu, ainda segundo Correia, (2003, p. 313) onde se pode ler: "Assim, o contributo útil do idoso tenderá a ser reconhecido, não só como um imperativo financeiro, mas também como uma necessidade social, por contrariar a constituição duma sociedade inclusiva e a promoção dum envelhecimento activo, mas também como uma necessidade económica face à diminuição da população activa."
Uma quarta hipótese viável prende-se com as actividades cognitivas, físicas e habilidades diversas, destacando-se, talvez, a informática, lúdicas, incluindo outras similares. Consideram-se louváveis e bem-vindas todas as iniciativas, que proporcionem aos idosos uma melhor qualidade de vida, nesta se incluindo as actividades que contribuam para o manter activo no seu todo: intelectual, física e ludicamente. As Universidades Seniores, como generosamente são denominadas, os ginásios desportivos, as viagens e passatempos diversos, são meios extremamente eficazes para manter os idosos, mental e fisicamente jovens, proporcionalmente às respectivas idades.
Instruir a pessoa, ainda na sua fase de vida activa obrigatória, com a antecedência possível, sempre antes da passagem à reforma, para, logo que esta aconteça, estar preparada para, dentro das possibilidade que lhe são oferecidas, optar por um novo e último ciclo da sua vida, ocupando-o com a (s) actividade (s) que mais são do seu agrado, poderia muito bem ser uma responsabilidade do Estado, das empresas e da sociedade, até porque o investimento assim realizado seria reembolsável no futuro, pela manutenção da auto-estima, boa condição intelectual e física do idoso que não necessitaria tanto do apoio medido-medicamentoso.
A educação e formação do idoso, para nesta fase da sua vida ter as melhores condições, não só para vier com melhor qualidade, como também para estar à altura de transmitir às gerações mais novas, que se lhe vão seguir, constitui uma estratégia muito interessante e de grande visão político-social, porque se acredita na sua eficácia, justamente para o bem-estar e felicidade espiritual do idoso. Se o Estado e algumas instituições investem nos jovens, em pelo menos duas vertentes: Educação e Formação, versus, Conhecimentos e Experiências, sem que primeiro se possam avaliar os resultados, o investimento nos idosos, que dentro de poucas décadas serão a maioria, torna-se uma possibilidade com futuro garantido, no sentido de prepararem os mais novos, porque vão ser estes que terão de assumir responsabilidades em muitos sectores das actividades de um país, de uma empresa e até de uma família, pelo que devem estar bem preparados a todos os níveis: científico, técnico e humano. Isto mesmo confirma a abordagem científica de Oliveira, (2006, p. 280), segundo o qual: "Uma educação que se preze deve abranger toda a personalidade tendo como objectivo uma educação holística ou global, visando o bem-estar ou a felicidade do educando, no caso vertente, do idoso, e ainda que ele atinja a sabedoria. Por outras palavras, deve ser uma educação com valores e para os valores ou uma educação axiológica." E, mais à frente o mesmo autor é bem claro quando afirma: "Em todo o caso, é lícito falar de uma educação para a reforma, tendo em conta as diversas situações do indivíduo e do meio, em geral fornecendo informações antecipadas sobre a situação e ajudando a superar as dificuldades. Os próprios reformados já há vários anos, estão em condições de ajudar, melhor que ninguém, os seus colegas, dada a experiência por que passaram."
Fica-se, pois, com uma primeira reflexão sobre a importância dos idosos e a riqueza que eles representam para o bem-estar e felicidade da humanidade, porque o património que eles carregam, fruto da educação e formação que foram adquirindo ao longo da vida, das experiências vividas e sabedoria acumulada não se pode perder. Jogar fora, por absurdos preconceitos etários de uns tantos responsáveis políticos e empresários, significa uma visão redutora, receosa da perda de um qualquer poder, ou de não o vir a alcançar mais cedo, porque, alegada e eventualmente, haverá um idoso no caminho da progressão de um jovem. O resultado, infelizmente, está à vista, um pouco por todo o mundo, por decisões tomadas por pessoas imaturas, inexperientes e imprudentes, a maior parte das quais com muito menos dos tais sessenta e cinco anos de vida. Reflicta-se primeiro e decida-se depois.
5. Resumo Conclusivo

Desenvolvida toda uma carreira profissional, seja qual for a actividade/profissão, durante um período obrigatório e relativamente longo, cerca de metade da vida, que de acordo com as novas perspectivas de longevidade, poderá corresponder a um período produtivo e de comparticipação fiscal-social de cerca de quarenta anos, segue-se uma nova fase, denominada de reforma/aposentação e ao consequente afastamento da actividade profissional que exerceu durante aquele longo período.
Os idosos, tal como as gerações que se lhes seguem, são o melhor património humano que um país pode ter, desde logo, se os responsáveis empresariais e de outras áreas, tiverem a inteligência e a visão estratégica de saber utilizar o imenso manancial de conhecimentos, experiências, sabedoria e prudência que a maior parte dos idosos possui, independentemente das suas culturas serem de natureza intelectualista ou antropológica. A pessoa humana, enquanto detentora de capacidades físicas, intelectuais e motoras em geral, pode (e deve) trabalhar para ela, para a família e para a sociedade, não havendo idade-limite para as funções, responsabilidades e actividades que ela sabe, pode e quer desenvolver. A riqueza de uma nação faz-se à custa da participação de todos e bem ao contrário da utilização apenas dos mais novos.
O último terço da vida humana, que se poderá situar a partir dos sessenta e cinco anos de idade, será, porventura, o mais sensível, estimulante e enriquecedor, para o próprio e para os que com ele convivem, nas diversas situações: família, ocupação, convívio, defesa de valores, convicções e boas-práticas, em diversas modalidades. Na verdade, é legítimo, justo e de direito que aos sessenta e cinco anos, o cidadão que, durante décadas se sujeitou ao exercício de uma actividade profissional, cumprindo inúmeras regras, desde logo, horários rigorosos, submetendo-se às mais diversas e difíceis situações hierárquico-funcionais, possa desligar-se dessa actividade, por via de uma reforma compensadora, que lhe permita uma vida confortável, extensivamente àqueles que, de alguma forma, dele dependem, porque para isso já investiu, coercivamente, pelas contribuições que pagou, ao longo do período activo produtivo.
Novas políticas para a dignificação, recuperação e intervenção dos idosos na sociedade de todos, pode significar a diferença entre um futuro de valores, de convicções, de ideais realizáveis e um futuro sem perspectivas, atípico, sem sentido de vida. O progresso material e a felicidade espiritual da pessoa integrada numa sociedade verdadeiramente humanista passa, imperativamente, pela consideração devida aos mais velhos e a tudo o que eles representam, com sucessos e com fracassos, porque eles são a história, a língua, a cultura, as tradições, os valores, o trabalho feito que os mais novos estão a usufruir e, se possível a melhorar. Nenhuma geração deverá ser excluída do processo de desenvolvimento harmonioso e sustentado da humanidade, porque à sabedoria e experiência de uns, adiciona-se o voluntarismo, a generosidade, a novidade e o risco de outros
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Venade-Caminha-Portugal, 2007

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
[email protected]
4910-354 Venade ? Caminha ? Portugal
Mestre em Filosofia Moderna e Contemporânea
Professor dos Ensinos: Secundário, Superior Politécnico e Universitário
Formador Ensino Técnico-profissional ? Níveis II, III e IV da União Europeia