MARCIO ROBERTO LENCO

 

 

 

 

 

 

DIREITO AO ESQUECIMENTO NO ORDENAMENTO INTERNO

 

 

DIREITO CIVIL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

UNIVERSIDADE SANTA ÚRSULA

CURSO DE DIREITO

RIO DE JANEIRO

2014

 

 

 

 

 

EMENTA:

 

Relatório:

 

  1. Trata-se de análise de matéria pertinente ao ramo do direito constitucional, requerida neste parecer pelo Núcleo de Pratica Jurídica IV, requerendo breve análise acerca do instituto denominado Direito ao esquecimento.
  1. O direito ao esquecimento seria um direito inerente a pessoa para que um fato, seja verídico ou não, mas que não lhe agrada, seja lembrado por outros e posto ao público esses fatos decorrentes da esfera particular. Guardadas as ressalvas.
  1. Procura-se enfrentar o tema trazendo à baila as argumentações pelo qual o atual ordenamento jurídico tem se debruçado para solucionar as demandas trazidas a porta do judiciário.
  2. Ao tratar do tema se faz necessário lançar mão de uma citação do jurista e filósofo francês François Ost:

Uma vez que, personagem público ou não, fomos lançados diante da cena e colocados sob os projetores da atualidade – muitas vezes, é preciso dizer, uma atualidade penal –, temos o direito, depois de determinado tempo, de sermos deixados em paz e a recair no esquecimento e no anonimato, do qual jamais queríamos ter saído[1].

(OST, 2005).

  1. É o necessário a relatar. Em seguida, exara-se o opinativo.

Fundamentação:

  1. No Brasil, o direito ao esquecimento possui é discutido sobre a base constitucional, considerando que é uma consequência do direito à vida privada, intimidade e honra.  Assegurados pela CF/88 (art. 5º, X) e pelo CC/02 (art. 21).
  2. Alguns autores também defendem a ideia de que o direito ao esquecimento é uma decorrência da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88).
  3. A discussão quanto ao direito ao esquecimento envolve conflitos aparentes entre a liberdade de expressão, o direito a informação, de serem informados, os interesses da coletividade, ou seja, os interesses da sociedade deverão prevalecer diante do interesse do particular na medida em que o agente em questão seja personagem público, desenvolva atividades ligadas aos poderes do Estado ou de qualquer outra maneira se relacione com atividades de interesse público de forma direita ou indireta.
  1. Continuando citando François Ost, quando faz referencia de um artigo de 1983 fundamentando o direito ao esquecimento:

                                                                                                      

(...) qualquer pessoa que se tenha envolvido em acontecimentos públicos pode, com o passar do tempo, reivindicar o direito ao esquecimento; a lembrança destes acontecimentos e do papel que ela possa ter desempenhado é ilegítima se não for fundada nas necessidades da história ou se for de natureza a ferir sua sensibilidade; visto que o direito ao esquecimento, que se impõe a todos, inclusive aos jornalistas, deve igualmente beneficiar a todos, inclusive aos condenados que pagaram sua dívida para com a sociedade e tentam reinserir-se nela. (OST -2005).[2]

  1. O tema tem ganhado força em razão da internet, pois todas as informações ali disponibilizadas tendem a se eternizar pela rede, trazendo por um lado a informação e por outro lado as vezes distorcidas, truncadas ou mal interpretadas, constrangedoras e também vexatórias e denunciantes, enfim existe informação para todos os tipos e gostos.
  2. No Brasil, o direito ao esquecimento voltou a ser palco de intensos debates em razão da aprovação de um enunciado nesse sentido VI Jornada de Direito Civil, além de o STJ ter julgado dois casos envolvendo esse direito há pouco tempo.

7.      Em recente matéria da revista Veja, sob o título de “O direito de ser esquecido é um bem que pode fazer mal”, se discute os resultados desta medida e seus efeitos imediatos que podemos esperar se o Brasil adotar tal medida.

Para os europeus, o direito ao esquecimento prevalece. Diz a decisão do tribunal europeu: “As pessoas têm o direito — sob certas condições — de pedir a remoção de links”. As “condições”, porém, não são claras. A medida não se aplica a casos de interesse público e a dados científicos ou de valor histórico. Mas não é definido o que se encaixa nas exceções. “Europeus têm tradição de declarar direitos abstratos cuja aplicação é complexa e difícil”, disse Jeffrey Rosen, professor de direito da Universidade George Washington.

O problema ficou evidente no início deste mês, quando o Google divulgou que, dos 70 000 pedidos de remoção de links, 12% vieram de pedófilos, e outra grande parcela é de políticos acusados de corrupção. Com dificuldades técnicas para analisar caso a caso — e a multa pelo não cumprimento chega a 2% de seu lucro anual —, o Google resolveu aceitar a maioria dos pedidos. Larry Page, CEO do Google, declaro­u-se “preocupado com o efeito da nova lei sobre a democracia”. Jimmy Wales, fundador da Wikipedia, enciclopédia virtual, também alvo da norma, engrossou o coro: “É censura radical”. Há claros interesses comerciais em jogo. Sites de buscas ganham em cima dos dados que guardam, usando-os para atrair anunciante. Mas sem dúvida a norma da União Europeia atinge frontalmente dois direitos essenciais, o de liberdade de expressão e o da imprensa.

Renomados veículos de comunicação europeus, como a BBC e o The Guardian, foram alertados pelo Google de que algumas matérias não apareceriam mais em sua busca (veja ao lado). Jornalistas e acadêmicos manifestaram-se contra a medida. Disse Fred Cate, professor de direito da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos: “O direito de ser esquecido é para quem quer reeditar o passado, e isso empobrecerá nossa história”. Os defensores enxergam vantagens. “Manter uma memória digital pode nos aprisionar ao passado”, concluiu o advogado Viktor Mayer-Schönberger, autor do livro Delete — The Virtue of Forgetting in the Digital Age (Delete — A Virtude do Esquecimento na Era Digital)[3] .

  1. Em março de 2013, na VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, foi aprovado um enunciado defendendo a existência do direito ao esquecimento como uma expressão da dignidade da pessoa humana.

Enunciado 531: A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento.

Seguido pelo STJ:

 A 4ª Turma do STJ, em dois julgados recentes, afirmou que o sistema jurídico brasileiro protege o direito ao esquecimento.

REsp 1.335.153-RJ e REsp 1.334.097-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 28/5/2013.

O Min. Luis Felipe Salomão também ressaltou que “ressalvam-se do direito ao esquecimento os fatos genuinamente históricos – historicidade essa que deve ser analisada em concreto – cujo interesse público e social deve sobreviver à passagem do tempo” (REsp 1.334.097).

  1. Nesse mesmo sentido também traz a baila as explanações do Min. Gilmar Mendes:

Se a pessoa deixou de atrair notoriedade, desaparecendo o interesse público em torno dela, merece ser deixada de lado, como desejar. Isso é tanto mais verdade com relação, por exemplo, a quem já cumpriu pena criminal e que precisa reajustar-se à sociedade. Ele há de ter o direito a não ver repassados ao público os fatos que o levaram à penitenciária.  (MENDES, 2007)[4].

  1. CONCLUSÃO:

 

  1. Entende, portanto, este parecerista que:
  2. Como já exposto acima, que a internet sempre terá meios para eternizar as notícias e informações ali disponibilizadas, pois a sociedade deve acompanhar os passos da tecnologia. Sempre ponderando no caso concreto e não visualizamos outra forma para que se respeite o direito ao esquecimento, o direito a informação dentre outros tão caros ás sociedades que emergem na democracia.
  3. Diante disso, atualmente, é impossível garantir, na prática, o direito ao esquecimento na internet. Existe até mesmo um ditado que afirma que “uma vez on line, para sempre on line”. Em outros termos, depois que algo foi para a internet, é impossível retirá-lo.
  4.  Justamente por isso é que embora o STJ  tenha apontado para essa direção, não nos parece crível tornar esse um direito máximo, haja vista que a luz das sociedades democráticas vigora um princípio basilar da publicidade e informação para que se viabilize a vida em sociedade sem que pessoas com interesses escusos possam se utilizar deste expediente para que sejam esquecidos seus desvios.
  5. Voltamos mais uma vez a afirmar a necessidade de total ponderação na aplicação desse direito para que possa ser aplicado apenas ao caso concreto,  cabendo poder judiciário a palavra final, sempre tendo o ministério público como entidade fiscalizadora e protetora da ordem pública e dos interesses difusos da sociedade.

 



[1] OST, François. O Tempo do direito. Trad. Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005, p. 160.

[2] ob. cit. p. 161.

[3] http://veja.abril.com.br/noticia/vida-digital/o-direito-de-ser-esquecido-e-um-bem-que-pode-fazer-mal - Revista Veja. Ed: 2382 – ano 47 – n. 29 – 16/ julho/2014. Reportagem: Filipe Vilicic e Fernanda Allegretti. – acesso em 26/07/14.

[4] Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 1ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 371.