Assistência simples x assistência litisconsorcial: diferenças e limites processuais
Por Kamila Pereira Cardoso | 09/04/2012 | DireitoRESUMO
O tema deste trabalho já foi diversas vezes debatido, mas é bem verdade que nunca é demais explicitar novamente um mecanismo tão importante para o processo civil como é a intervenção de terceiros, especialmente nesta produção a assistência. É possível que um terceiro se insira em uma relação processual para assistir quem ele julga que deve, e tomar parte, agindo de acordo com os limites estabelecidos em lei. O assistente simples ou litisconsorcial ,tem como principal função auxiliar e a grande diferença entre os dois casos reside na relação jurídica processual. Enquanto na assistência simples a relação é entre o assistente e o assistido, na assistência litisconsorcial a relação jurídica é entre o assistido e o adversário do assistente.
Introdução
A harmonia da vida em sociedade só é possível com a existência de normas reguladoras de condutas. Estas são necessárias por que é sabido que desavenças sociais sempre existiram e sempre existirão. O Direito tem, portanto, a finalidade máxima de resolvê-las da forma mais pacífica e justa possível. Inserido no Direito aparece o Processo Civil munido de regras de condutas de ação, que regulam problemas na relação jurídica processual.
Todo processo precisa de dois sujeitos fundamentais para que seja a ele dado seguimento, são estes o autor e o réu. Mas o ordenamento brasileiro permite ingresso de terceiros interessados direta ou indiretamente no processo, dando a eles a oportunidade de se expressar para garantir de alguma forma o direito que é deles.
São duas a formas de intervenção de terceiros, a primeira diz respeito à intervenção de terceiro que é buscada pela parte, que julga necessária a participação do outro no caso, como exemplos tem a nomeação a autoria, denunciação da lide e chamamento ao processo. A segunda é a forma voluntária do terceiro, onde o sujeito externo ao processo afirma o possível sofrimento de dano se não houver interferência sua na lide, sem que uma das partes originárias solicite sua inclusão no processo, como exemplos a oposição, e a assistência.
A assistência é o objeto de avaliação deste trabalho, e será feita a distinção entre assistência simples e a litisconsorcial, todas disciplinadas pelo Código do Processo Civil. A grande diferença, explicitando desde já, reside na atuação que pode ter o terceiro em cada processo e nos efeitos que o interessado sofre com a solução do caso. Será explicitado também que o assistente não age de forma banal e muito menos da forma que lhe for mais agradável, existem sim limites que estão regulados na lei, e devem ser cumpridos para o saudável desenvolvimento da lide.
1. O Terceiro na relação processual
Para que se complete a relação jurídica processual é necessária a participação do Estado, do autor e do réu. Em um processo podemos classificar como partes processuais os que fazem parte do processo e principalmente os quais o resultado da lide lhes diz respeito. De um lado da relação tem quem formula os pedidos, o autor e do outro lado tem a quem os pedidos são direcionados, o réu. Estes sujeitos processuais são as peças principais em qualquer caso.
O ingresso de um sujeito à parte do caso, que não faz parte da relação jurídica original entre as peças principais do processo (autor e réu), o torna um terceiro. Este não é titular da ação, mas apresenta grande interesse na solução da lide, seja por ter interesse em quem assiste, ou por interesse no adversário do assistente. Conclui-se de acordo com Gusmão Carneiro que terceiro é um contra-conceito, isto é o terceiro é todo aquele que não for parte.
A intromissão do estranho na relação processual pode ser voluntária ou coativa, mas deve existir interesse jurídico, que dê justificativa a intervenção. Wambier afirma conhecer a impossibilidade de existir uma sentença que tenha efeitos somente entre as partes originárias do processo. As circunstâncias excepcionais que possam diretamente atingir outros são as passíveis de intervenção. Logo todo processo, de alguma forma atinge terceiros, e cabe aos interessados buscar seu direito de ação e lutar para que a sentença não o atinja e prejudique.
O terceiro interveniente torna-se parte, assim que for configurada sua intervenção, é portanto importante explicitar que o terceiro é “parte do processo” e não é “parte da demanda” por que não é parte originária da lide em curso. Não pode existir confusão, também, entre o litisconsorte necessário que estava ausente, e o terceiro. Gusmão Carneiro afirma que o litisconsorte necessário é parte originária, e deveria estar lá no pólo passivo ou ativo da ação desde o início. Se fosse litisconsorte necessário, ele deveria estar lá desde o início do conflito, o assistente não, ele pode ser chamado, se necessário, ou pode ingressar para garantir seu direito agindo juntamente com a parte originária.
2 .Tipos de Assistência
O ordenamento jurídico prevê a possibilidade de duas modalidades de assistência. A assistência simples e a assistência litisconsorcial. A diferença entre as duas está na atuação das partes e do assistente bem como nos efeitos que o assistente pode sofrer com a sentença a ser proferida pelo juiz que decidirá o caso.
Para que seja admitido na relação jurídica em crise, o candidato a assistente deve ter um interesse jurídico no caso, para que sua intromissão na lide seja legítima. Este interesse deve ser considerado de acordo com o que pretende o possível assistente sendo relevante ou não a ponto de ele ser considerado algo essencial para o caso. Logo interesse econômico ou de fato não são argumentos suficientes ou relevantes para possibilitar a entrada do terceiro em uma relação jurídica.
A assistência pode ser simples (adesiva) ou litisconsorcial, dependendo do interesse jurídico do assistente. Quando o interesse for indireto, isto é, não vinculado diretamente ao litígio, diz-se que a assistência é simples ou adesiva [...] Quando o interesse for direto, ou seja, o assistente defender direito próprio, a assistência é denominada litisconsorcial [...].(Nunes, 1998, p.77)
O interesse jurídico é importante, assim como a influência que a decisão da lide terá sobre o terceiro. Na assistência simples a influência é potencial, ou seja não se tem garantia se vai atingir ou não o terceiro, já na assistência litisconsorcial a sentença, com certeza, atingirá a relação jurídica do terceiro. A entrada do assistente na lide alheia pode ocorrer desde a citação do réu, até o momento anterior ao trânsito em julgado, como disciplinam os artigos 50 e 54 do Código de Processo Civil.
A aceitação de um terceiro na lide como assistente ou não é feita por petição inicial, sendo necessário o deferimento do pedido. O juiz deve analisar o pedido, e se este não for cabível por falta de algum dos requisitos necessários, pode simplesmente indeferi-lo. Mas se todos os requisitos do ingresso à assistente forem preenchidos, o juiz deve intimar as partes, se não houverem impugnações o pedido será deferido.
Requerendo o terceiro sua intervenção como assistente (simples ou qualificado), deverá o juiz ouvir as partes integrantes da relação processual no prazo de cinco dias. Não havendo impugnação, o requerimento deverá ser deferido. Havendo, porém, impugnação por qualquer das partes, deverá o juiz determinar a autuação em apartado do incidente, autorizando a produção de provas e, após a produção destas, decidirá o incidente. É de se notar, que este incidente não constitui processo autônomo (sendo, portanto, decido através de decisão interlocutória, sujeita a recurso de agravo), e que o mesmo não é causa de suspensão de processo. (Câmara, 2006, p.194)
Em relação aos limites de atuação que o assistente deve e pode ter na relação processual, o Código de Processo Civil em seu artigo 52 determina que, “o assistente atuará como auxiliar da parte principal exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido”. Mas o assistente litisconsorcial, por estar submisso ao artigo 54 do CPC, não é regido pelos mesmos limites de atuação do artigo 52 do CPC, que rege a assistência simples.
3. Assistência Simples
A assistência simples caracteriza-se pela intervenção do terceiro em processo para auxiliar uma das partes, para que a parte assistida tenha a sentença a seu favor. Luiz Rodrigues Wambier classifica esta espécie como “a mais autêntica das formas de intervenção de terceiros”. Essa autenticidade ocorre devido ao terceiro permanecer na condição de terceiro, mesmo depois de integrado no processo.
Primeiramente, o terceiro entra no processo para ser um assistente, colaborando com uma das partes, o alcance máximo é a sentença favorável para quem o estranho da relação processual está ajudando. Logo, percebe-se a participação mínima que tem o terceiro no processo. O terceiro não pode formular pretensão ou defesa, e sua presença no processo não faz necessária outra lide para que seja julgado com a lide original.
O artigo 50 do CPC que disciplina a assistência simples expõe que para este ingresso na lide de outros, é necessário que exista interesse jurídico do terceiro, para que sua parte de alguma forma não seja afetada. E isso não significa que o terceiro tenha alguma desavença jurídica com o adversário da parte que este está colaborando, ele busca sempre o não sofrimento com uma decisão contrária a esperada.
Alexandre Freitas Câmara exemplifica esta relação com o exemplo de uma “ação de despejo”, onde são partes originarias o locador e o locatário. O terceiro que intervém no processo não é titular desta relação, no caso a locação, mas ele faz parte da sublocação, que é subordinada a relação originária. Ele deve, portanto ingressar como assistente simples.
O assistente simples pode ser afetado de duas maneiras, desde o momento do proferimento da sentença é atingido. E também que, assim que proferida a sentença, o terceiro corre o risco de ser atingido pela decisão de processo posterior, que pode ser movido pelo vencedor da demanda (em que o terceiro devia ter sido assistente).
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