Artigo: A licitação do transporte coletivo em Maceió

Roberto Ramalho é advogado, jornalista e foi procurador da Secretaria Municipal de Proteção ao Meio Ambiente de Maceió

Finalmente depois que o Poder Judiciário determinou que a Prefeitura Municipal de Maceió fizesse a licitação do transporte coletivo de Maceió, o líder do prefeito na Câmara Municipal de Maceió, Sílvio Camelo (PV), afirmou que a licitação teria a agilidade que foi determinada pela decisão judicial da 14ª Vara da Fazenda Municipal.

O vereador Silvio Camelo destacou no final de maio do ano passado que era do interesse do prefeito de Maceió, Cícero Almeida (PP), que a licitação ocorresse, porque o Executivo municipal atual era o que mais "tinha investido em melhorias para o trânsito de Maceió".

Por causa disso tudo, Silvio Camelo teve que usar a tribuna em aparte a vereadora Silvânia Barbosa (PTdoB) que destacou que a licitação só saiu em função da pressão do Ministério Público Estadual (MPE) e da Justiça, obrigando a Prefeitura de Maceió a fazer a licitação, sem manobras Legislativas, evitando imbróglios jurídicos que atrapalhassem o processo que já se arrastava há anos.

Em face dessa ação do Poder Judiciário e do Ministério Público, Sílvio Camelo havia destacado que o Executivo já tinha publicado no Diário Oficial a nomeação de uma comissão para a preparação do edital da licitação.

O líder do prefeito havia afirmado que a demora era em decorrência de problemas em relação à espera do projeto de lei que tramita na Câmara de Vereadores e que serve de marco regulatório para a licitação do transporte público municipal.

Essa demora toda segundo ele se devia em razão do projeto se encontrar na Câmara Municipal de Maceió e aguardar parecer das Comissões de Constituição e Justiça, Orçamento e Finanças, Serviços Públicos e Servidor Público para poder ser votado finalmente em plenário.

O prazo para que a matéria fosse votada era de no mínimo 45 dias. No entanto, como a decisão do Poder Judiciário afirmou o vereador que não mais existia a necessidade da espera da votação do projeto, e o Poder Executivo estaria autorizado a realizá-la.

Já o vereador Paulo Corintho (PDT) também havia falado sobre o assunto e reclamado das condições do transporte público afirmando que a licitação era importante, porque o edital previa a qualidade dos serviços que devem ser ofertados à população. Disse, ainda, que atualmente a frota estava sucateada e que os empresários se preocupavam somente com o lucro e esqueciam-se de oferecer um transporte de qualidade.

O que é mais estranho nisso tudo era o comportamento do prefeito Cícero Almeida que queria recorrer da sentença da Exª Juíza e adiar a licitação dos transportes coletivos urbanos de Maceió. O que ele ganharia com isso? Provavelmente seria ajudado pelos atuais proprietários de empresas de transportes coletivos na próxima eleição para algum cargo público.

Mas, finalmente, o polêmico projeto de lei que trata do marco regulatório para a licitação do transporte público municipal em Maceió foi aprovado em primeira discussão pela Câmara Municipal de Maceió, no dia 14 de junho do ano passado por dezenove vereadores que se fizeram presentes para aprovação do projeto, sendo, dias depois, aprovado em segunda votação, tendo sido sancionada pelo prefeito Cícero Almeida.

Na ocasião, o relator e presidente da Comissão de Constituição e Justiça, vereador Ricardo Barbosa, avaliou que os seus pares haviam cumprido com sua missão. Durante o ato ainda fez menção a péssima qualidade pelos serviços prestados pelas atuais empresas da capital a população.

Senhor prefeito: a população de Maceió já não mais agüentava sua atitude de adiar a licitação. Os ônibus que atualmente estão trafegando na cidade estão praticamente sucateados, sendo a grande maioria deles com mais de oito anos de uso, quando a lei determina que eles só possam rodar até no máximo oito anos, com uma pequena exceção em relação à frota que está rodando.

Uma licitação como essa deve conter as seguintes fases na minha modesta opinião jurídica:

1. Estudo técnico e formação de um projeto, através de sugestões, inclusive da comunidade.

2. Fase do processo licitatório para a definição da empresa que ficará responsável pelo transporte coletivo da cidade. Nessa fase, a Comissão de Licitação do Transporte Coletivo deverá abrir os envelopes contendo as propostas técnicas das empresas participantes

3. As empresas deverão comprovar que possuem um número mínimo necessário de ônibus a ser oferecida à população, estrutura física, como o local de atuação e todos os requisitos operacionais que vão oferecer aos usuários. Esta etapa também pode desclassificar caso a empresa não ofereça os requisitos mínimos determinado pelo edital. Tanto o município e as empresas podem contestar os dados por meio de recursos.

4. Em seguida, a prefeitura convoca as empresas pela Comissão de Licitação para a terceira fase do processo com a abertura dos envelopes contendo as propostas financeiras.

5. A quarta fase será a apuração da pontuação final de cada empresa participante, e a quinta e última etapa será a declaração da empresa vencedora.

Ainda analisando a matéria a luz do Direito Administrativo e Lei de Licitações e Contratos, dentre os critérios de julgamento previstos no artigo 15 da Lei de Concessões, o único que atende ao princípio da modicidade tarifária é o tipo licitatório menor tarifa. Assim sendo, por esse critério o julgamento é realizado de forma eminentemente objetiva, vencendo a licitação aquele que oferecer o serviço nos padrões da especificação técnica com o menor custo possível.

Observo, também, que a elaboração de um projeto básico consistente é de fundamental importância para o sucesso da concessão de transporte coletivo municipal. É o projeto básico que demonstrará todas as características como, por exemplo:

a) A realidade da demanda local,
b) Da topografia,
c) O tipo de vias,
d) Os horários de pico,
e) O tamanho da frota necessário,
f) Sua idade média e máxima,
g) Os custos a comporem a tarifação
h) E todas as variáveis que interferirem na disponibilização do serviço à comunidade.

Deve o projeto básico ser elaborado previamente, norteando a elaboração do edital e dele fazendo parte.

Finalizando, sobre a matéria concessão de serviços públicos a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Licitação e Contratos determinam abaixo:

A Constituição Federal, além de traçar no caput de seu artigo 37 os princípios que devem reger a Administração Pública, estabeleceu a licitação como norma fundamental, que só pode ser excepcionada nos casos previstos em lei. Senão vejamos:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Igualmente ficou instituída na Constituição Federal a obrigatoriedade de prestação de serviços públicos, de forma direta pelo Poder Público ou sob o regime de concessão ou permissão de serviços públicos, após prévia licitação, nos termos do artigo 175, in verbis:

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

II - os direitos dos usuários;

III - política tarifária;

IV - a obrigação de manter serviço adequado.

Dessa forma, a disciplina normativa das licitações e contratos administrativos tem seu núcleo primordial na Constituição Federal de 1988. É, portanto, na Carta Magna que, em face do princípio da constitucionalidade ou hierarquia das leis, seu regramento deve ser procurado primeiramente. [03]

Concluindo, na esteira desse entendimento, a legislação infraconstitucional não poderá dispensar a licitação, tampouco o regime de concessão ou permissão para serviços públicos.

O único ponto negativo de tudo isso, foi que a licitação sequer foi concluída e o Tribunal de Justiça já autorizou o aumento das passagens para R$ 2,30, em total desrespeito a referida legislação e ao povo de Maceió.