Num belo e ensolarado dia, o antropólogo inglês de origem polonesa, Malinovski, desembarcou nas ilhas do Pacífico Ocidental numa expedição patrocinada pelo governo inglês para fazer uma pesquisa sobre a cultura dos povos da região no início do século XX. Para não se contaminar com os relatos de comerciantes patrícios, evitou manter com eles qualquer tipo de contato e foi diretamente à fonte.  O seu receio é que a visão etnocêntrica ou mesmo preconceituosa dos estrangeiros poderia influenciá-lo em sua missão de estudar a cultura desse povo.

Assim, autorizado pelo chefe tribal, montou acampamento no meio da aldeia e a partir daí começou a árdua tarefa de aprender o idioma, os costumes, as estruturas familiares e de relações sociais, o sistema econômico etc., usando como forma de sedução o fumo que trazia em sua bagagem, muito apreciado pelos nativos. Os nativos fanáticos pela nicotina proporcionada pelo tabaco plantado no sul dos Estados Unidos, muito se esforçaram para que Malinowski aprendesse os rudimentos do idioma para obter as informações de que necessitava.

E assim Malinovski mergulhou na tarefa de conhecer os papuas, pigmeus, dobus, tobriandeses etc.  Entre os Dobus, ele observou que as mulheres são amistosas e agradáveis em todas as classes sociais, não preservam a castidade e a liberdade sexual é bastante ampla. O casamento é muito simples e quase sem cerimônia. Em resumo, a mulher vai morar na casa do marido e ponto final.

A estrutura de parentesco era matrilinear, ou seja, é a mãe que definia a relação de parentesco com os filhos e não os homens, o que de certa forma ocorre com os judeus.  Assim, se a mãe é judia os filhos são judeus, no entanto se apenas o pai o é, não há uma comprovação automática. No entanto, o poder político era e continua masculino. A fidelidade no casamento era esperada, mas não era uma obrigação e a mulher podia procurar outro marido sem maiores dificuldades. A família da mulher tinha obrigações econômicas em relação ao casal. A herança era transmitida do homem para os filhos das suas irmãs e não havia nenhuma obrigação em relação aos seus filhos. Acreditavam que o papel do homem era secundário na procriação e os pais eram vistos, pelos próprios filhos, mais como um amigo do que como genitor. Era expressamente proibido a um homem gracejar ou falar livremente com uma irmã ou na presença dela ou mesmo olhar para ela.

O chefe tinha o direito de exercer a poligamia e as famílias de suas esposas pagavam a ele tributos em forma de alimentos com os quais ele honrava seus compromissos ou dava festas, cerimonias ou reuniões tribais. Como o principal produto cultivado na região são as batatas, um chefe poderoso tinha muitas batatas e com elas podia dar suas festas, receber outras tribos e fazer comemorações.

E acabei de reler o romance Quincas Borba do velho e bom Machado de Assis e o associei à pesquisa de Malinowski nas ilhas do Pacífico Ocidental.  Será que Machado ficou sabendo do costume dos habitantes da região em cultivar batatas e que elas se constituíam na sua principal riqueza? Quem sabe, mas Quincas Borba só publicou o romance em 1891. Entretanto, bem que poderia ter tido acesso a informações sobre esse povo por meio de relatos de viajantes. Infelizmente a cultura dos povos da região foi contaminada pelos vencedores ocidentais que acabaram proibindo as suas formas tradicionais de estrutura familiar e outros costumes. Assim, “ao vencedor as batatas”, como diria o sábio criador do Humanitismo.