ANDERSON, Perry. Linhagens do estado absolutista. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1989.(pp58/83)
Por Luis Carlos Borges dos Santos | 20/09/2011 | ResumosRESENHA
ANDERSON, Perry. Linhagens do estado absolutista. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1989.(pp58/83)
Resenhado por: Alexsandro R. Menez, Luana Pacheco Silva, Luis Carlos Borges dos Santos, Mateus Rocha*
Historiador, professor e editor, Perry Anderson teve sua posição marxista influenciada por Jean-Paul Sartre, após seu período de militância na universidade. Entre suas produções de maior destaque estão: Linhagens do Estado Absolutista; Passagens da Antiguidade ao Feudalismo; A crise da crise do Marxismo.
O livro Linhagens do Estado Absolutista de Perry Anderson inicia sua abordagem criando um modelo teórico sobre a formação dos estados absolutistas na Europa Ocidental. O autor inicia a sua abordagem partindo de uma discussão teórica sobre o modelo do surgimento dos estados absolutistas formulado por Marx e Engels. A partir desta análise o autor vai formulando seu próprio modelo da formação dos estados absolutistas no ocidente europeu, na qual esta baseada no processo que deu origem aos estados absolutistas, sendo as luta de classes entre a nobreza e o campesinato do campo e as populações pobres das cidades.
Esta resenha deteve-se no Capitulo Espanha nas paginas 58 a 83, com o objetivo de apresentar a formação do Estado absolutista espanhol e as formas que levaram ao seu declínio.
Perry Anderson observa a importância da Espanha para o surgimento dos outros Estados absolutistas europeus, sendo a Espanha não meramente uma consequência dos acontecimentos históricos, mas uma das determinantes para esse processo de centralização política no resto da Europa Ocidental.
Anderson destaca que o absolutismo espanhol, possui duas grandes especificidades que o destacam perante os outros Estados europeus. Em primeiro lugar, através da utilização de políticas de casamentos dinásticos, os reis espanhóis puderam anexar ao seu patrimônio os novos territórios adquiridos com este mecanismo feudal, ou seja, a questão de linhagem de parentesco da casa dinástica da família Habsburgo rendeu ao império espanhol uma escala de territórios e influência a qual nenhuma monarquia rival pode se igualar, fato este que superou de longe qualquer outra linhagem européia.
A segunda especificidade espanhola foi uma grande concentração de riquezas obtidas através da exploração de metais do Novo Mundo. Seguindo neste contexto nenhum outro grande Estado absolutista na Europa Ocidental viria a ter um caráter tão aristocrático ao desenvolvimento burguês.
No entanto devido à ameaça da dominação Habsburgo sobre as outras dinastias européias, estas se fortaleceram para a defesa contra a Espanha, ou seja, o império espanhol acabou consequentemente fortalecendo os outros estados rivais europeus.
Ou seja, a união entre os reinos de Castela e Aragão deu origem ao nascimento do estado espanhol, destacando que o reino de Castela possuía uma forte economia lanífera, enquanto o reino de Aragão era uma potência territorial e comercial. Convém lembrar que esta união segundo o autor possuía uma base econômica aparentemente forte.
Anderson apresenta durante o texto as características econômicas e políticas de Castela. Destacando que Castela era um reino no qual predominava uma aristocracia senhorial, estes por sua vez possuíam enormes domínios territoriais e formavam uma ordem militar poderosa. Castela era formada também por um considerável número de cidades, embora não houvesse ainda nesse tempo uma capital fixa, no entanto estas não desempenhavam um papel econômico relevante.
Para o autor, durante a Idade Média 2 a 3% da população controlavam cerca de 97% do solo. Isto implica dizer, que mais de uma metade pertencia a umas poucas famílias de nobres. Com isso o autor apresenta o perfil econômico castelhano, destacando que esta era produtora de cereais, havendo uma intensiva prática pastoril, conseqüentemente a produção de lã constituiu a base das fortunas de tantas casas aristocráticas, o que estimulava o crescimento urbano e o comércio com os reinos estrangeiros.
O reino de Aragão estava dividido em três províncias: a província de Aragão, que segundo o autor possuía o mais repressivo sistema senhorial da península ibérica, pois, esta província tinha estruturas feudais dominantes.
A província de Catalunha, a qual tinha sua economia baseada no comercio marítimo no Mediterrâneo. Anderson destaca que esta província era prospera economicamente, no entanto devido à depressão feudal e a Peste Negra nos séculos XIV e XV, a província entrou em um declínio econômico. A terceira e ultima província do reino de Aragão era Valencia, ou seja, crescendo economicamente através do comercio, devido também ao declínio econômico da Catalunha.
Anderson coloca que o reino de Aragão possuía uma melhor estrutura de Estado se comparado com Castela. Sendo que cada província do reino de Aragão possuía as suas respectivas cortes, e também outras instituições estatais. No entanto ressalta, que em Castela devido ao poder da aristocracia as cortes castelhanas eram fracas e frágeis, pois, a aristocracia castelhana não tinha interesse de representação nas instituições do estado.
Dessa forma defende que as diferenças entre as instituições estatais dos dois reinos foram à causa da incapacidade da monarquia espanhola em "unificar" administrativamente o próprio império espanhol.
Em conseqüência desse fator o autor vai argumentar que posteriormente, não houve também uma unificação das anexações territoriais, em decorrência da própria não unificação (administrativa) de Castela e Aragão.
Para Anderson as conquistas territoriais como, por exemplo: Granada, Nápoles, Navarra, Américas, Milão, Franche-Comté e os países baixos proporcionaram o fortalecimento do absolutismo espanhol no Velho Mundo.
Salientando que o absolutismo espanhol estava progredindo internacionalmente devido a uma política externa de conquistas e anexações diplomáticas através da política de casamentos.
No entanto destaca que a estrutura interna do absolutismo espanhol demonstrava fragilidade na sua relação triangular entre os impérios europeu, império americano e as pátrias ibéricas. Esta fragilidade administrativa é ressaltada por pelo autor , como tendo origem na assimetria da união do Estado de Castela e Aragão, pois, esta diferença administrativa entre os dois reinos iria "[...] traçar toda a carreira da monarquia espanhola a partir de então" (ANDERSON, 2005, p.63).
Para o autor a partir da segunda metade do sec. XVI (com a ascensão do Felipe II ao trono espanhol) o império espanhol passa a ficar economicamente dependente das possessões do Novo Mundo, agravando dessa forma a desunião do império. Esta dependência foi conseqüência dos enormes gastos nas políticas externas nos territórios do Velho Mundo, consequentemente os territórios do Velho Mundo não tinham mais capacidade de suprir as necessidades militares do absolutismo espanhol, dessa forma o descobrimento dos metais no Novo Mundo passa a suprir e abastecer o Estado espanhol. Isto acabou consequentemente agravando o processo de desunião administrativa (interna) das províncias espanholas, pois, a "[...] obstinada recalcitrância de Aragão era compensada pela complacência ilimitada do Peru" (ANDERSON, 2005, p.69).
Dessa forma pode-se entender a posição do autor, pois, o grande fluxo de metais do Novo mundo que passou a "alimentar" o Estado espanhol no seu anseio militar, impediu que este Estado (centrado em Castela) força-se uma definitiva união administrativa entre as suas províncias ibéricas.
Um ponto importante na argumentação do autor é a forma que o metal americano entrava na metrópole do Estado Habsburgo. Segundo ele a tributação do metal do Novo Mundo não era tão alta como se imagina, ressaltando que a maior parte do metal americano entrava na península ibérica através da transferência privada, ou seja, o estado espanhol arrecadava a maior parte do lucro dos metais através dos impostos.
Dessa forma destaca-se que esta espécie liquida arrecadada pelo estado espanhol proporcionava uma grande flexibilidade financeira, esta vantagem financeira do estado espanhol era utilizada na sua política externa através das intervenções militares no Velho Mundo.
Como conseqüência da maior parte do metal americano não ir diretamente para os cofres do estado, que era trocado por mercadorias vai acarretar no inflacionamento nos preços dos produtos.
Desta maneira inflacionamento dos produtos castelhanos vendidos a colônia (como têxteis, azeite e vinho) vai intensificar a produção dos mesmos, ocasionando o gradual abandono da produção de cereais. Como resultado disso, a Espanha passa a exportar cereais a partir da década de 1570.
A Espanha torna-se a "America da Europa", com a entrada de produtos estrangeiros, ou seja, a prata americana vai acabar com o potencial de Castela (a sustentação do império segundo o autor), devido aos financiamentos para as campanhas militares externas. Para Anderson toda esta debilidade econômica era conseqüência do fraco controle administrativo do estado espanhol.
Por fim podemos entender o a argumentação do autor da seguinte forma: o império americano vai minar as estruturas da economia espanhola, que por sua vez vai deteriorar o império europeu (e as províncias ibéricas), o que vai significar a ruína do estado absolutista espanhol, e fechando este circulo vai estar o esforço de guerra espanhol.
Também destacando que o agravamento desta complexa rede estrutural da economia e da política espanhola foi a revolta da Holanda, este território para o autor desempenhava um papel importante para o funcionamento da economia castelhana e também devido a sua importância para a política externa espanhola.
Nesse sentido, a eclosão da Guerra dos Trinta Anos foi uma oportunidade para a Espanha dar o troco na Holanda e recuperar o território estratégico da Renânia, bem como acabar com o protestantismo na Alemanha.
Apesar disso Anderson enfatiza que o intento espanhol fracassou, saindo derrotada do conflito, inclusive o absolutismo francês aproveitou das fraquezas internas dos espanhóis para invadir o seu território. Todavia esta derrota e declínio espanhol ocorreram devido ao "[...] preço histórico do fracasso do Estado Habsburgo em harmonizar os seus reinos [...]" (ANDERSON, 2005, p.78), pois, o autor ressalta que este fato já era evidente antes mesmo do inicio da Guerra dos Trinta Anos.
Para concluir a analise do Estado absolutista espanhol o autor vai destacar que por volta do final do século XVII o Estado Habsburgo estava aniquilado. Ou seja, a Espanha após a guerra de sucessão tentou renovar o seu absolutismo através do advento da monarquia dos Bourbon. Anderson destaca que o absolutismo francês conseguiu criar um estado unitário espanhol, já que o Estado Habsburgo não foi capaz de fazê-lo.
Destacando que apesar das reformas carolinas para modernização do estado espanhol, isto já era tarde demais para a Espanha alcançar o desenvolvimento da França e Inglaterra.