ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE MIGRAÇÕES

Por Jarsen Guimarães | 21/09/2010 | Sociedade

ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE MIGRAÇÕES
Jarsen Luis Castro Guimarães

I. INTRODUÇÃO
O fenômeno migração é um assunto tão antigo quanto à origem do homem. Se buscarmos nas escrituras bíblicas Adão e Eva foram expulsos do paraíso e tiveram que viver em outro lugar. Moisés migrou com seu povo do Egito em busca da terra prometida e o menino Jesus, para escapar de Pilatos, teve que se refugiar em outra cidade. Diversos são os motivos que levam as pessoas a migrarem: político, econômico, social, ideológico, religioso, entre outros.
Este trabalho busca tratar de algumas abordagens teóricas sobre a migração, relacionando a sua importância e contribuição para o desenvolvimento do mundo globalizado. A partir disso aborda as tendências migratórias no Brasil, com base nos dados da PNAD 2004, os aspectos recentes do crescimento e distribuição da população na Amazônia brasileira e alguns aspectos positivos e negativos da migração, dando ênfase a importância das remessas internacionais para o país.

II. CONCEITOS: EMIGRAÇÃO, IMIGRAÇÃO E MIGRAÇÃO
Conforme Rocha e Trindade (1995), o termo emigração designa a saída de alguém com ausência suposta de duração significativa. Emigrar significa deixar a pátria ou a terra própria para se refugiar, trabalhar temporariamente, estabelecer residência em país estranho. Os atores dessa ação serão designados de emigrantes. Por outro lado, no destino dessas pessoas, elas serão encaradas como aquelas que chegam do exterior, serão denominadas de imigrantes. Assim, um mesmo indivíduo recebe a denominação de imigrante e de emigrante.
Devido o fluxo muito grande e intenso de pessoas se deslocando de região para região, os conceitos de imigração e emigração perderam espaço para uma única denominação, migração. Assim, o movimento migratório de entrada e saída de pessoas é denominado de migração. Dessa forma, migração descreve a existência de movimentos que, de unidirecionais, se transformam tipicamente em oscilantes, sem distinção explícita entre origem e destino, entre quem parte e quem chega.
Dentro desse contexto encontra-se a Migração Interna, a qual designa os movimentos de população que se realizam dentro das fronteiras do Estado. Caso esse tipo de migração tiver duração inferior a um ano e se repetir ciclicamente com periodicidade anual, será chamada de Migração Interna Sazonal. Já as Migrações Temporárias correspondem estadias a priori limitadas no tempo. As migrações sazonais são um caso particular destas.
Os motivos da migração são os mais diversos, destacando-se o econômico, motivações políticas, motivações emergenciais, como é o caso dos refugiados, motivações étnico-culturais, entre outras.

III. TEORIAS SOBRE MIGRAÇÃO
O processo de teorização do conhecimento sobre migração caracteriza-se por uma heterogeneidade de enfoques, porém nenhuma teoria completa ainda foi validada. Ravenstein (1889) já observava essa complexidade ao enunciar que "as leis da população, e as leis econômicas não tem em geral o rigor das leis físicas".
Patarra (2006) ressalta que as novas modalidades migratórias demandam, no cenário da globalização, a necessidade de reavaliação de paradigmas, para o conhecimento e o entendimento das migrações internacionais no mundo, bem como a própria definição do fenômeno migratório deve ser revisto.
Conforme Castiglioni (2009), alguns fatores contribuem para dificultar a apreensão e a explicação do migração, como conceituação desse teme, restringida por problemas conceituais e técnicos; as dificuldades para a obtenção de dados adequados no sentido de testar teorias formuladas e criar indicadores; a heterogeneidade de modelos, o que dificulta a generalização e a construção de um quadro geral; fatores estruturais situados em níveis macros e micros que atuam condicionando o fenômeno migratório; os impactos da migração que afetam as regiões de origem e destino dos migrantes e; a natureza multidisciplinadora do fenômeno migratório.
Assim, o tema migração é de grande abrangência e requer uma série de cuidados para a sua compreensão. Na base das pesquisas sobre esse assunto encontra-se o trabalho de Ravenstein (1885) que após observar as peculiaridades das migrações, propôs generalizações sobre a ocorrência das migrações. O seu trabalho é conhecido como "As leis das migrações". Em Peixoto ( 2004), encontramos essas leis da migração propostas por Ravenstein, vejamos:
a) A maioria dos migrantes apenas percorre uma curta distância, e as "correntes de migração" dirigem-se para os centros de comércio (e de indústria).
b) O processo de atração para uma cidade em rápido crescimento começa pelas suas zonas circundantes, e gradualmente estende-se para lugares mais remotos.
c) O processo de dispersão é o inverso do de atração.
d) Cada corrente principal de migração produz uma contra - corrente compensadora.
e) Os migrantes provenientes de longas distâncias preferem os grandes centros de comércio (e da indústria).
f) Os nativos das cidades são menos migratórios do que os das zonas rurais do país.
g) As mulheres são mais migratórias do que os homens.
Castiglioni (2009) propõe a formulação de princípios de base do quadro teórico de análise do fenômeno migração. Para isso, com base em trabalhos Castiglioni (2009) desenvolvidos sobre o esse tema e tendo como suporte Peixoto (2004) e Sasaki e Assis (2000) apresentam-se a seguir algumas teorias:
1. Modelos explicativos preditivos
Tratam o movimento migratório com equações matemáticas que possibilita a descrição do fenômeno e de suas variações no tempo e no espaço e são utilizados para estimar e explicar os fluxos migratórios.
2. Teorias Econômicas
Baseiam-se nos postulados da teoria neoclássica. Fundamentam-se na assunção da "escolha racional" do indivíduo. Dessa forma, a migração resulta de uma decisão individua para maximizar o lucro. Dentro dessa lógica, destacam-se as seguintes teorias:
2.1. Teoria do Everett S. Lee
Nesta teoria, a escolha racional do indivíduo se pauta na avaliação dos fatores positivos e negativos associados às regiões de origem e destino, que estão à base do processo de decisão.
2.2. Diferenciais de Renda e de Oferta de Emprego
Destacam-se as abordagens de Todaro (1969) e de Herris e Todaro (1970) inspiradas nos problemas de desemprego e subemprego generalizados e crônicos que caracterizam as regiões urbanas dos países em desenvolvimento. Nestas teorias, a decisão de migrar de uma área rural para uma área urbana depende da percepção, por parte do migrante, do lucro esperado.
2.3. A Teoria do Capital Humano: Análise de Custo e Benefícios
Fundamenta-se na teoria neoclássica do investimento, mais especificamente na teoria de Gary Becker segundo a qual o "o capital humano, tal como o capital físico, pode construir um recurso econômico". O investimento em capital humano é definido como a aplicação dos recursos em escolarização, formação profissional, cuidados médicos, migração, os quais resultam, em um horizonte mais longo, na melhoria do rendimento monetário e psíquico das pessoas.
3. Teoria Histórico Estrutural: A Transição da Migração
Inspirada na teoria da transição demográfica, faz uma análise da transição de mobilidade nas diferentes fases do desenvolvimento. A hipótese dessa teoria é que há regularidades definitivas e sistêmicas no crescimento da mobilidade pessoal através do tempo e do espaço durante a história recente, e estas regularidades apresentam um componente essencial do processo de modernização.
4. Teorias Sociológicas
Esse grupo de teorias tem como base o trabalho de Thomas e Znaniecki, publicado em 1818, intitulado " The Polish Peasant in Europe and America" . Vejamos as principais teorias desse grupo:
4.1. Complementaridade dos Processos de Imigração ? Emigração
De acordo com Sayad (1998), o principal argumento dessa teoria é de que há uma complementaridade dos processos de imigração e de emigração, duas faces de uma mesma realidade. O autor ressalta que a imigração é um fato social completo e como tal se coloca em um ponto de inter-relação entre as diversas disciplinas do campo das ciências sociais. Conceitua imigração como um deslocamento de pessoas no espaço. Nesse sentido, espaço de deslocamentos não é apenas um espaço físico, mas também um espaço qualificado em muitos sentidos, seja social, econômico, político, cultural religioso e etc.
4.2. Redes Migratórias
Preconizam que os imigrantes não devem ser considerados individualmente, mas como integrantes de estruturas sociais mais amplas, cujos atores realizam conjuntamente as várias etapas do empreendimento migratório.
Nas redes migratórias, o motivo econômico pode não atuar como a principal causa da migração de grupos. O princípio da solidariedade, subjacente a essas redes locais, transcende por vezes, o motivo econômico.
Peixoto (2004) também defende essa idéia de que as redes migratórias sobrepõem-se, por vezes, as questões econômicas, e tem um papel fundamental na decisão de migrar do indivíduo. De acordo com o autor, os fluxos migratórios são resultantes de contextos históricos particulares e adquirem uma dinâmica interna que lhes confere as características de um sistema.
Conforme Sasaki e Assis (2000) apud Massey (1990) as redes migratórias compõem um conjunto de laços sociais que ligam comunidades de origem a específicos pontos de destino nas sociedades receptoras. Tais laços unem migrantes e não migrantes em uma complexa teia de papéis sociais complementares e relacionamentos interpessoais que são mantidos por um quadro informal de expectativas mútuas e comportamentos predeterminados.
Segundo a teoria de redes migratórias o processo de decisão de migrar não decorre de uma decisão racional individual, mas de ações coletivas que ocorrem no núcleo de unidades mais amplas, redes familiares e sociais, cujas ações coletivas levam em consideração não somente os motivos econômicos, mas também as expectativas dos grupos.
5. Teorias que Consideram Níveis Elevados de Agregação
Esse grupo de teorias congrega as abordagens que condicionam as migrações aos fatores estruturais dos contextos de origem e de destino do movimento.
5.1. O Mercado de Trabalho Dual
Considera que a tomada de decisão de migrar se fundamenta em forças que operam em níveis mais elevados de agregação, associadas à demanda do mercado de trabalho das modernas sociedades industriais. O mercado de trabalho dual é formado por dois segmentos: mercado primário, mercado que exige qualificação e; mercado secundário, o qual exige pouca qualificação.
5.2. Teoria do Sistema Mundo
Considera que a migração internacional é uma conseqüência natural da formação do processo de desenvolvimento capitalista. O traço principal do sistema ? mundo é a criação de um mercado de trabalho global, no qual as forças estruturais da economia mundial geram os diferenciais econômicos responsáveis pela existência de "zonas salariais" diferenciadas. Segundo Peixoto (2004), um dos traços específicos da economia mundial é a criação de uma zona de atividade produtiva transnacional, a cargo de organizações (empresas transnacionais) não existentes, na sua forma atual, há poucas décadas. A instalação de empresas deste tipo em países menos desenvolvidos gerou fluxos migratórios para o centro, quando teoricamente os deveria ter diminuído, por procurar o trabalho, menos qualificado e mais barato, na sua zona de residência habitual.
3.1. Sobre os Determinantes dos Processos Migratórios
De acordo com Araujo et all ( 2007), os deslocamentos populacionais realizam-se pela ponderação entre fatores de expulsão e atração, push and pull, sempre na busca de ganhos adicionais de bem estar. Naturalmente, esta abertura quase ilimitada no conjunto fatorial propicia a inserção de uma série de variáveis, mas é praticamente consensual que emprego e renda são as preponderantes.
"a migração é um fenômeno reflexo, isto é, uma manifestação de processos e transformações sociais e econômicas mais profundas , que lhe são subjacentes. Trata-se , pois de um tema que, por quase não ter uma essência própria , não pode ser estudado de forma particularmente estanque. Seu objeto de interesse e tratamento não podem ficar predominantemente a uma especificidade cientifica". ( MOURA, 1980).

IV. TENDÊNCIAS MIGRATÓRIAS NO BRASIL: DADOS DA PNAD 2004
Os dados a seguir são baseados no trabalho de Hakket e Martine (2004). Conforme os autores, a busca de melhores condições de vida fundamenta a maioria dos deslocamentos populacionais. Para populações em idades ativas, isso normalmente significa a busca de melhor emprego e de renda. As pessoas se deslocam para aquelas localidades onde sua rede de informações ? que, evidentemente, pode não ser perfeita ? lhes indica que existem maiores possibilidades de encontrar um trabalho ou uma atividade melhor remunerada. De forma agregada, isto significa que a grosso modo os migrantes seguem a mesma rota que os investimentos econômicos.
4.1. Fluxos migratórios no período recente
Uma parcela importante dos fluxos migratórios recentes no Brasil sofreu tanto uma redução de volume quanto mudanças de rumo em comparação com qüinqüênios anteriores. Tais alterações nos padrões tradicionais migratórios podem ser observadas em relação aos fluxos inter-regionais, assim como inter - estaduais. Provavelmente o resultado mais marcante sobre a migração se refere à aparente ruptura do padrão histórico da migração inter-regional entre o Nordeste e o Sudeste.
Não somente o Sudeste passou a ser menos atrativo para migrantes das outras Regiões, mas também um grande número de pessoas residentes em outras Regiões, especialmente no Sudeste, optou por residir no Nordeste. Conforme se verá mais adiante, uma parte significativa desta migração para o Nordeste é composta de migrantes de retorno. Nos mesmos períodos, as Regiões Norte e Centro-Oeste mantiveram uma tendência declinante no que se refere a migrantes recebidos ? embora continuassem com saldos positivos ? e a Região Sul passou pela primeira vez a ter um saldo migratório positivo.
1.1. Migração Inter-regional
De acordo com os dados, o número de pessoas que migraram da sua Região de residência (nos últimos cinco anos) para outra Grande Região aumentou de 3.226 mil para 3.364 mil entre 1986-91 e 1995-2000, mas diminuiu significativamente, para 2.863 mil, entre 1999-2004. Essa redução é particularmente notável tendo em vista o aumento da base de migrantes em potencial no país como um todo
1.2. Migração interestadual
No período 1995-2000, ao lado dos fluxos da Bahia (1º lugar), Minas Gerais (3º), Pernambuco (4º) e Paraná (5º) para São Paulo, havia três contra- fluxos de São Paulo para Minas Gerais (2º), Paraná (6º) e Bahia (7º). No período 1999- 2004 todos esses fluxos continuavam entre os dez mais importantes, à exceção do fluxo de Pernambuco para São Paulo, que agora passou a ser substituído por um fluxo no sentido oposto (8º), confirmando a tendência notada acima com respeito à mudança de sentido predominante dos fluxos inter-regionais entre o Sudeste e o Nordeste. Com isso, enfrentamos agora o fato extraordinário de que os saldos migratórios tanto da Região Sudeste como do Estado de São Paulo se tornaram negativos: - 215.236 e - 155.132, respectivamente.
1.3. Migração de retorno
No Brasil inteiro, 17,7% dos migrantes inter-regionais eram migrantes de retorno para o seu município de nascimento; 12,7% estavam voltando para o seu Estado de origem, embora para outro município; e 2,4% eram naturais da Grande Região, mas não da UF. No caso do Nordeste, entretanto, essas porcentagens são muito maiores, com uma migração de retorno particularmente elevada no caso dos migrantes provenientes da Região Centro-Oeste. No caso específico do Estado da Paraíba, cujo aumento do saldo migratório não pôde ser explicado satisfatoriamente acima, as porcentagens se encontram próximas desta média regional.
1.4. Migrações para regiões metropolitanas
As nove Regiões Metropolitanas (RMs) antigas (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre) continuam dominando o panorama demográfico e econômico do país. "o crescimento demográfico das aglomerações metropolitanas tem sido declinante". Presume-se, freqüentemente, que a importância da migração para essas cidades é cada vez mais reduzida.
No período 1940-70, a taxa de crescimento do conjunto das nove RMs havia sido de 4,54% ao ano. Essa taxa declinou para 3,79% na década de 70, para 2,02% na década de 80 e para 1,75% na década de 90. Entretanto, os dados para o período 1999-2004 estariam mostrando uma ligeira, mas surpreendente, retomada da taxa de crescimento das RMs, comparado ao período anterior (1.93% ao ano contrastando com o anterior 1.75% ao ano). Essa reversão é particularmente inesperada tendo em vista que:
a) A taxa de fecundidade do país e das RMs encontra-se cada vez mais baixa;
b) Os outros tipos de migração, tanto inter-regional como intra-regional, têm se arrefecido no período (vide discussão nas seções anteriores);
c) O país está passando por uma fase de desconcentração e diversificação espacial da atividade econômica, especialmente industrial, que deveria redundar numa redução do crescimento metropolitano; e
d) Os dados sobre migração em direção urbana, apresentados acima, mostram que os migrantes se dirigem, de preferência, para outras áreas urbanas que as RMs tradicionais.
No Brasil tem ocorrido uma ampliação da importância demográfica e econômica de uma rede de metrópoles, coerente com a dimensão geográfica do país e com o processo de desconcentração relativa e de crescimento das economias regionais. Nas discussões referentes às mudanças no padrão demográfico das RMs, presume-se que a importância da migração para essas cidades está regredindo.
4.2. Seletividade de migração
O grupo de migrantes com maior nível de educação é aquele que está voltando do exterior: oito dos doze grupos de migrantes voltando do exterior têm mais de dez anos de escolaridade na média. Brasília, Rio de Janeiro e Santa Catarina/Rio Grande do Sul são as UFs que recebem os migrantes com maior nível de educação. Como é razoável supor, dados os níveis médios de educação no Nordeste, os migrantes que saem dessa Região têm o menor número de anos de escolaridade.
O nível educacional da população natural dos municípios da RM é superior ao dos migrantes em todas as RMs. Entretanto, a diferença é pequena, pois quase todas as categorias de migrantes em todas as RMs têm um nível educacional relativamente privilegiado, em comparação com suas respectivas médias regionais. Não se observam diferenças significativas no nível educacional dos migrantes de acordo com seu tempo de residência na RM, embora o nível educacional dos mais recentes tenda a ser um pouco mais elevado em várias RMs.
A composição por sexo dos fluxos migratórios recentes, segundo a PNAD de 2004 variou relativamente pouco. Como acontece na maioria dos países latino- americanos, as migrantes femininas predominavam nos fluxos para as Regiões Metropolitanas, à exceção da Região Metropolitana de Belo Horizonte, na qual a proporção de sexo era de 1,03. As menores razões de sexo são encontradas nas Regiões Metropolitanas de Fortaleza (0,75), São Paulo (0,81) e Curitiba (0,84). Nas outras áreas urbanas não existia uma predominância clara de migrantes masculinos ou femininos, mas as mulheres de fato predominavam nos fluxos migratórios do Nordeste para as áreas urbanas não-metropolitanas do Pará e de São Paulo, e da Região Sudeste para as áreas urbanas não-metropolitanas da Bahia. Por outro lado, os homens predominavam entre os migrantes do Nordeste para a Região Metropolitana de São Paulo e para o Distrito Federal.
No que se refere à renda dos migrantes e naturais, as pequenas diferenças educacionais observadas acima em favor da população natural dos municípios da região metropolitana não se traduzem em superioridade de renda. De fato, os migrantes apresentam, na média, um nível superior de renda em sete das dez cidades do total e "população masculina" e em seis de dez cidades de "população feminina". O maior diferencial de renda a favor dos naturais se encontra em São Paulo e o maior diferencial a favor dos migrantes em Salvador e Recife. Conforme os autores, o mais surpreendente, se comparado com os padrões observados no Censo de 1970, é que, em muitos casos, os migrantes mais recentes são os que têm maior nível de renda entre toda a população migrante. Este fenômeno ocorre em oito das dez regiões metropolitanas na população masculina e em cinco regiões metropolitanas na população feminina.
Essas diversas comparações entre a situação de educação e renda de migrantes e naturais, e entre migrantes segundo seu tempo de residência no município, para o período 1999-2004, mostram uma mudança radical com os padrões observados uma geração atrás. A atual geração de migrantes é composta primordialmente de pessoas que antes residiam em outras áreas urbanas, com nível educacional muito superior ao da geração anterior e que têm melhores condições de competir no mercado de trabalho metropolitano. A inversão da situação dos migrantes recentes é particularmente notável.
Há apenas uma geração, essa categoria era sempre composta dos grupos menos privilegiados; agora, pareceria que esses migrantes se encontram em situação visivelmente melhor do que a maioria dos outros grupos. Isso poderia sugerir a existência de um grupo relativamente significativo de pessoas mais competitivas que se movem no mercado de trabalho nacional com mais freqüência.

V. ASPECTOS RECENTES DO CRESCIMENTO E DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
Tendo como referência o último período censitário, Rocha (2005) observa a situação demográfica regional e os aspectos demográficos atuais sobre o ritmo de crescimento e distribuição da população.
5.1. Amazônia no contexto nacional
No Brasil, existem duas delimitações tradicionais da Amazônia: A Região Norte, e a Amazônia Legal, que a grosso modo, está integrada pelos estados que compõem a região Norte, mais o estado do Mato Grosso e o estado do Maranhão a oeste do meridiano.
5.2. Padrões de organização do espaço regional e dinâmica demográfica
No processo histórico de povoamento do território da Amazônia Legal ressalta-se características geográficas e demográficas expressas em dois grandes padrões de ocupação, distribuição da população e uso do território: o padrão rio ? várzea ? floresta e o padrão estrada ? terra firme ? subsolo. O primeiro padrão, rio ? várzea ? floresta, é fruto da dinâmica econômica que remonta ao período colonial. Já o padrão estrada ? terra firme ? subsolo, é fruto de políticas públicas de integração nacional.
5.3. Efetivo populacional, crescimento e distribuição da população regional
5.3.1. Efetivo e crescimento populacional
O demográfico regional tem obedecido às peculiaridades de organização do espaço regional. Em geral, as migrações junto com altas taxas de fecundidade são as responsáveis pela mudança no tamanho, no ritmo de crescimento, na estrutura e na distribuição da população. Internamente, mesmo apresentando sinais de atenuação, a distribuição da população da Amazônia mantém perfil concentrador.
5.3.2. Concentração populacional, urbanização e municipalização do território
Estudos realizados pela SUDAM/PNUD (2001), mostram que tanto o crescimento vegetativo das áreas urbanas já existentes como os fluxos migratórios com destino urbano e a incorporação como quadros urbanos de localidades, constituem fatores que têm influenciado na mudança do perfil da distribuição da população regional. Destacam-se como fator estimulador desse processo de urbanização as migrações.
A Urbanização também se fez presente a partir da ampliação do número de cidades nas margens das rodovias: agrovilas, agrópolis, rurópolis, company towns, construídas a partir dos projetos de colonização e projetos de infra ? estrutura e técnico ? econômico.
5.4. Migração inter e intra ? regional
Na Amazônia, os fluxos migratórios foram importantes no crescimento populacional e no redirecionamento do povoamento e da ocupação do espaço regional. Atualmente, algumas áreas como o Norte do Mato Grosso, o sudoeste e o Oeste do Pará passaram a se constituir em pólos de atração populacional, desde a última década, face à expansão da soja.
O Estado do Pará apresentou características migratórias diferentes do Estado do Amazonas. A população residente não natural saltou de 900.639 para 1.046.154 e os paraenses residindo fora do estado totalizam 122.956, em 1991 e 560.783, em 2000.
5.5. Perfil do crescimento demográfico dos municípios da Amazônia Legal, 1991/2000
Dos 757 municípios da Amazônia Legal, a maioria (33,8%) apresentou altas taxas de crescimento e 20,7% apresentaram crescimento moderado. Outros 21,1,% perderam população e 24,6% se mantiveram com crescimento estável. Os municípios que apresentaram maior crescimento se concentraram no Pará e em Mato Grosso, enquanto aqueles que perderam população concentram-se nos estados do Maranhão, Tocantins e Mato Grosso.
5.5.1. Municípios com perda populacional
As principais características dos municípios com perda populacional são: a) Ritmo de crescimento anual negativo (totalizava 160 municípios, ou seja, 21% do total de municípios da Amazônia Legal; b) Possuíam população de até 50 mil habitantes; c) Foram criados no transcurso 1991-2000.
Os mais expressivos foram:
- PARÁ: Anapu (-3,92%), Curionópolis (-3,87%), Senador José Porfírio (-4,21%), Sapucaia (-3,49%) e Rio Maria (-4,56%).
- RONDÔNIA: Colorado do Oeste (-2,20%).
- ESTADO DO ACRE: Porto Walter (-1,80%).
- ESTADO DO AMAZONAS: Novo Airão (-4,10%), Santa Izabel do Rio Negro (-4,16%)
- RORAIMA: Normanda (-2,10%).
-TOCANTINS: Palmeirópolis (-3,05%)
- MARANHÃO: Serrano do Maranhão (-6,17%)
5.5.2. Municípios com crescimento de 0% a 1,5% ao ano
As principais características são: a) Baixo crescimento (186 municípios, ou seja, 24,6% do total da Amazônia legal); b) Maioria com população até 50 mil habitantes (segundo o IBGE são municípios já saturados em termos populacionais e com níveis baixos de fecundidade).
Os mais expressivos foram:
- MATO GROSSO: Acorizal (1,03%) e Barra das Garças (1,49%).
- RONDÔNIA: Cacoal (0,61%), Ji-Paraná (0,99%) e Espigão D?Oeste (1,17%)
- ACRE: Jordão (0,63%) e Xapuri (1,30%).
-ESTADO DO AMAZÔNAS: Boca do Acre (0,85%), Manicoré (0,05%).
- RORAIMA: Mucajaí (0,66%)
- PARÁ: a) Municípios com áreas economicamente deprimidas: Almerim (0,17%), Augusto Corrêa (0,96%), Baião (0,57%) e Magalhães Barata (0,54%). b) Municípios de áreas dinâmicas economicamente: Bom Jesus do Tocantins (1,40%), Cumaru do Norte (0,60%), Itaituba (0,29%) e Medicilândia (0,93%).
5.5.3. Municípios com crescimento de 1,5% a 3,0% ao ano.
As principais características são: Crescimento demográfico relativamente elevado (155 municípios, ou seja, 20,5% do total).
Os mais expressivos foram:
- RONDÔNIA: Alta Floresta do Oeste (1,52%) Ariquemes, Guajará-Mirim (1,75%) e Nova União (2,72%).
- ACRE: Sena Madureira (2,22%), Brasiléia (2,22%).
-AMAZONAS: Eirunepé (2,81%), Benjamin Constant (2,70%) e Itacoatiara (2,32%).
-PARÁ: Além de Belém tiveram crescimento as cidades de Abaetetuba (1,99%), Altamira (1,76%) e Anajás (2,83%), dentre outros.
5.5.4. Municípios com crescimento de mais de 3% ao ano.
Na Amazônia, 256 municípios (33,8%) apresentaram esse padrão de crescimento, destacando as capitais Manaus, Macapá, Rio Branco, Boa Vista e Palmas.
Alguns municípios tiveram crescimento extremamente elevado, com taxas acima de 7% ao ano, destacando-se municípios de RORAIMA (eixo da BR 174), do AMAPÁ, municípios situados no norte do MATO GROSSO (eixo da BR 163), Sudeste do PARÁ (margens do rio Xingu) e Sudeste do AMAZONAS.

VI. ALGUNS ASPECTOS DA MIGRAÇÃO
O cenário de globalização da economia, não só potencializa que muitos migrem em busca de oportunidades de mobilidade social e melhores condições de vida, mas também ao ampliar a distancia entre os que têm e os que não têm (Castro, 2006).
Segundo Ávila e Frederico (2005), o fluxo migratório contemporâneo apresenta uma conotação massiva. De acordo com os relatórios das Nações Unidas, o número de pessoas que participam diretamente de tais corrente migratórias internacionais cresceu consideravelmente durante a segunda metade do século XX. Atualmente, por volta de 175 milhões de pessoas residem em países diferentes ao do nascimento. A Europa Ocidental, os Estados Unidos e certos países de Oceania são os principais destinos dos migrantes internacionais.
O fenômeno migratório internacional também deve ser abordado tanto pelo lado da oferta de força de trabalho (ou push effect), quanto pelo lado da demanda de força de trabalho (ou pull effect). De modo geral, o push effect que impulsiona a migração internacional no sentido Sul-Norte vincula-se com realidades sociais, políticas e econômicas imperantes nos países em desenvolvimento que agem no sentido de "expulsar" ou "empurrar para fora" a população com condições reais ou potenciais para migrar. Já o o pull effect surge de fenômenos tais como a chamada "segunda transição demográfica" ou acelerado envelhecimento da estrutura da população, o alto e crescente déficit no número de pessoas em idade produtiva que ingressam aos mercados de trabalho, o crescente desequilíbrio entre a população ativa e passiva ? com impacto direto nos sistemas de previdência e seguridade social.
Para Orozco e Wilson (2005) o fluxo migratório produz uma ampla gama de efeitos econômicos em todo o planeta. Essas interconexões alimentam a oferta e a demanda de cinco elementos da migração: remessas, turismo, transporte, telecomunicações e comércio nostálgico. Esses elementos estão adquirindo uma dinâmica própria, com importantes conseqüências para o progresso dos países em desenvolvimento e de sua integração com a economia global. Nesse contexto, surge a importância dos Bancos e de outras Instituições Financeiras que percebem a importância dessas remessas. Assim, para atrair esses consumidores oferecem uma variedade de opções facilitadora para se fazer remessas, tais como: caixas eletrônicos, transferências automáticas, bem como da diminuição dos custos de transação, entre outros.
De acordo com Bueno e Baeninger (2008) as remessas constituem resposta à realidade que as nações mais pobres vivem nesse processo de globalização. Entende-se por remessas aquela porção de dinheiro enviada aos países de origem por trabalhadores imigrantes que operam em países estrangeiros. Os Bancos Centrais registram em suas estatísticas e balanças comerciais os fluxos de remessas que ingressam nesses países, e a informação é também remetida ao Fundo Monetário Internacional. Esta organização considera que as remessas dos trabalhadores imigrantes constituem bens e instrumentos financeiros transferidos pelos nacionais que residem e trabalham em algum país estrangeiro durante mais de um ano. Segundo os autores, não existe uma teoria da determinação das remessas, mas hipóteses teóricas alternativas ou combinadas para diferentes tipos de remessas, de acordo com seus propósitos:
a) Perspectiva Estruturalista: A tendência comum desses estudos era considerar que, em geral, a migração tinha efeito negativo na economia e na estrutura social das comunidades de origem. Assim, embora as remessas permitissem elevar o nível de vida da população, para mantê-lo, era necessária também uma migração constante, já que não existiam fontes de renda alternativas nas comunidades comparáveis com as remessas. Considerando que a maior parte das remessas se destina a gastos improdutivos (moradia, festas, bens de consumo e de luxo), fica claro que os efeitos multiplicadores das remessas se reduzem ou acabam se filtrando nas grandes urbes e na economia internacional.
b) Perspectiva Funcionalista: A firma que as remessas constituem importante fonte de financiamento de investimentos produtivos, como o impulso de pequenas empresas. Por outro lado, algumas pesquisas mostram que essas mesmas inversões produtivas também estimulam o consumo via remessas e incrementam a demanda de bens e serviços do país de origem. Assim, sob a abordagem funcionalista, a migração internacional não representa drenagem de recursos da economia; pelo contrário, as remessas configuram uma forma de poupança-migrante que constitui fonte importante de capital produtivo e força dinâmica na promoção da atividade empresarial, na formação de negócios e no crescimento econômico, pelo menos em âmbitos locais e regionais.
c) Enfoque Contemporâneo: considera as remessas não como uma forma de poupança, nem como uma fonte para o investimento produtivo, mas como um fundo privado que se destina em maior medida ao consumo e à reprodução material das famílias, permitindo a melhoria das condições de vida dos parentes dos migrantes e agindo em casos particulares como compensação do empobrecimento geral derivado das crises econômicas recorrentes e às políticas conjunturais para ajustá-las.
As remessas têm importantes efeitos multiplicadores a nível nacional, regional e local. Zárate-Hoyos (2000), utilizando um multiplicador baseado na matriz de contabilidade social do México fazem várias simulações para essa questão, na qual se destaca o setor serviços apresentando o maior multiplicador da produção. Em todas as simulações feitas o maior multiplicador de renda se gera nos setores de lugares urbanos. Os resultados indicam que os lugares rurais geram vínculos de demanda com agentes e setores economicamente mais dinâmicos das cidades médias e grandes. Aponta também que os multiplicadores de produção do setor agropecuário são baixos.

VII. CONCLUSÃO
Diversas teorias tentam explicar o fenômeno migração, abordando diferentes aspectos e buscando uma uniformidade, porém a migração é um tema de difícil consenso devido a sua multiplicidade de causas e conseqüências e heterogeneidade de enfoques. O próprio conceito tem-se adequado as novas demandas da globalização.
O porquê das pessoas migrarem tem causas mais diversas possíveis, desde questões econômicas, políticas, religiosas, culturais até ideológicas. As tendências migratórias do Brasil e da Amazônia seguem o padrão do mundo globalizado, levando em consideração uma seletividade no processo migratório.
Quanto aos aspectos positivos e negativos dessa ação, ainda estão longe de serem diagnosticados e prognosticados na sua totalidade, mas alguns já se mostram claramente importantes, como é o caso das remessas internacionais, as quais, mesmo em pequenas quantidades individuais, mas com um volume total considerado, tem sido objeto de atenção de entidades financeiras nacionais e internacionais.



VIII. Referências

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