A Língua Portuguesa na América

Por cleidson jacinto | 20/04/2009 | Educação

A implantação do português no continente sul-americano não se deu dissociada de aspectos sócio-político-culturais. Partindo do estudo da formação do território nacional pelos portugueses, Ilari e Basso atribuem às entradas, às bandeiras e aos ciclos econômicos o papel da expansão do território, cerca de três vezes superior à delimitação do Tratado de Tordesilhas. Essa imensidão territorial resulta hoje no fato de o Brasil ser o maior país de língua portuguesa não só em extensão, mas também no quantitativo de falantes. Entender como se deu a formação do território é relevante para entender o português hoje, porque evidencia o multilinguismo já presente nos muitos movimentos de ocupação devido à preponderância de negros , índios e mestiços, falantes de um português marcado por interferências claramente indígenas e africanas.

Além dos tratados, conquistas e fronteiras, a difusão da língua portuguesa no território brasileiro se deu com a ocupação dos espaços , a destacar, com o crescimento demográfico, com a urbanização e com a ocupação do interior. O Rio de Janeiro, por exemplo, possuía 50 mil habitantes e, com a chegada da corte portuguesa, recebeu 15 mil portugueses que, além dos hábitos e valores culturais, trouxeram a pronúncia "chiante" dos esses finais, ainda hoje marca do falar carioca. A ocupação feita nas regiões afastadas da costa é posterior a essas explorações. Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia, por exemplo, possuíam densidade populacional tão baixa que parte desses locais foi, ainda em 1953, definida como "território inespecífico". Na Amazônia, a ocupação foi diferente. O ciclo da borracha atraiu mais de trezentos mil nordestinos, que tomaram diversos rumos após o fracasso econômico com a borracha. Ademais as questões territoriais, as mudanças da sociedade também têm influência na implantação do português no Brasil. Nos séculos XIX e XX, o Brasil passou por regimes políticos comoa monarquia e a república com as marcantes fases do Estado Novo e a Ditadura Militar, além claro, dos ciclos econômicos da borrachae do café, bem como da centralização das indústrias no Centro-sul, acontecimentos responsáveis por migrações de mão-de-obra interna e externa e que hoje explodem nas desigualdades sociais . De tudo isso há marcas no português aqui falado.

Não obstante, é preciso olhar com maior atenção para o multilinguismo nos séculos iniciais e para o bilingüismo mais recente como aspectos esclarecedores para a compreensão do português da gente. Afinal, a língua lusitana implantada aqui não foi tal qual a falada na Europa. As 340 línguas não indo-européias dos 6 milhões de índios existentes no início da colonização não morreram com a imposição do colonizador. Tanto é verdade que os portugueses tiveram de aprender algumas línguas indígenas para catequizá-los ou para, até mesmo, impor o domínio. Não são poucas hoje as palavras do português do século XXI de origem indígena, pertencente ou não ao tronco tupi-guarani. Essa influência só foi diminuída com o decreto do Marques de Pombal proibindo a língua geral- mistura das línguas. Hoje, no entanto, há o renascimento da valorização das línguas indígenas com apoio a escolas indígenas, bem como com a valorização humana através das reservas indígenas. As línguas africanas, por sua vez, estiveram presentes na formação do português no Brasil, sobretudo pela atuação guerreira de africanos ou de afro-descendentes.

A riqueza em ser o único país lusófono da América se dá, dentre outros aspectos,pelo fato de essa língua ser aqui fruto de falantes nativos de Portugal, falantes indígenas, falantes africanos e falantes que aprenderam o português no Brasil, fortemente marcado pela convivência desses diversos falantes.